"Não há nada como o sonho para criar o futuro. Utopia hoje, carne e osso amanhã."
Como já citei aqui e aqui, alguns
comportamentos observáveis da mecânica quântica parecem dar um nó na realidade que nos é palpável. Um deles é o que se
chama de entrelaçamento, ou emaranhado, quântico.
Resumida e grosseiramente (não significa que eu sei explicar completa e
finamente), vamos imaginar dois elétrons como duas bolas de
bilhar separadas, uma em cada lado da mesa. Imagine que uma das bolas está girando no sentido horário, enquanto a outra está obrigatoriamente girando
no sentido anti-horário. Considere que existe algum tipo de vínculo entre as
bolas, sem se preocupar com a natureza dessa conexão, de forma que se
invertêssemos o sentido de giro da primeira, a segunda, instantaneamente, teria
seu sentido de giro também invertido. Seria como se uma bola influenciasse a
outra, como se estivessem conectadas de alguma maneira. As bolas de bilhar
foram apenas um exemplo, mas no caso de pares de partículas subatômicas, como os
elétrons, isso não é uma suposição, mas acontece sim, é real.
Como se não fosse suficientemente "louco" para a noção de realidade física
que possuímos, ainda há um problema mesmo para a mecânica quântica: esse tipo
de conexão continuaria existindo entre as duas bolas de bilhar mesmo que elas
estivessem cada uma em um extremo do Universo (se é que há extremos no
Universo, como já citado aqui e aqui).
Para tentar entender melhor o tamanho do problema, vamos pensar na Via Láctea. Alguns cientistas acabaram
de descobrir que a distância entre os extremos da nossa galáxia é de 200 mil anos-luz. Isso significa que,
se estivéssemos viajando a velocidade da luz (aproximadamente 300.000 quilômetros por segundo), levaríamos 200 mil anos para cruzar a Via
Láctea de uma ponta a outra. Quanto é 200 mil anos? Basta pensar que a
humanidade desenvolveu a escrita há somente cinco mil anos. Voltando às nossas duas bolas de bilhar, lá do
inicio, imagine que elas estejam cada uma em uma extremidade da nossa galáxia.
Ao inverter o sentido de giro de uma delas, a outra teria seu sentido invertido
instantaneamente. Não levaria 200 mil anos para que uma sentisse o efeito da
outra. E é aí que está o problema, não existe nada que pode ser mais rápido que a velocidade da luz. Então, como isso é
possível? Pois é, não há nada conhecido, ainda, que explique essa conexão entre
pares de elétrons. Ou mesmo se estamos entendo o comportamento corretamente.
Como citado no vídeo do primeiro link, Albert Einstein dizia que o
emaranhamento quântico sugere uma força fantasmagórica, que supera a velocidade
da luz e, por isso, ele não acreditava que ela fosse possível. Além disso, como
já citei aqui e aqui, na mecânica
quântica, não podemos realizar algumas medições nas partículas sem que haja uma
influência de nossa parte. O observador sempre interfere sobre os parâmetros que
ele está medindo. Portanto, Einstein acreditava que tudo não passava de falha
de interpretação. Para ele, tudo poderia ser simplesmente explicado através de
um par de luvas. Imagine que eu coloque em uma caixa apenas uma mão de um par de
luvas e envie para você pelo correio. Quando você perceber que recebeu a mão
direita, instantaneamente saberá que eu estou com a mão esquerda. Pronto, Einstein
acreditava que tudo fora definido no momento que as partículas foram criadas e
que nós estávamos sendo iludidos pela dificuldade que temos em determinar o
estado das partículas subatômicas.
Seria tão simples se Einstein estivesse certo novamente. Porém, parece
que pesquisadores conseguiram provar que há sim uma conexão entre pares de partículas e que Einstein
estava errado. Como ainda há muito o que desemaranhar (com o perdão do
trocadilho) sobre entrelaçamento quântico, a melhor explicação que se pode dar
até o momento, ironicamente, é a mesma que Einstein refutou, há uma força fantasmagórica
que conecta pares de partículas subatômicas.
Poxa, fiquei com uma vontade de terminar esse texto aqui. Porém, essa
introdução foi útil apenas para explicar a diferença entre a força fantasmagórica
e o par de luvas. O quê? Explicando a piada? Todos sabemos que só há uma coisa que
pode piorar uma piada ruim, e é justamente a tentativa de explicá-la.
Desvio sem volta: "Nossas
cicatrizes servem para nos lembrar de que nosso passado foi real."
Quais as preocupações até aos 10? Nunca ficar muito longe dos pais. Outras?
Comportar-se bem para ganhar o brinquedo desejado, ou pelo menos conseguir algumas
horas de brincadeira na rua. Ah, a ansiedade para fazer 18, idade tão adulta e
independente quando se olha a partir dos 10.
Aos 18, pela primeira vez olha para o futuro com um olhar de
conquistador. Deseja sair de perto dos pais, subjugar o mundo. Um caderno e uma
caneta sobre a escrivaninha. Uma mochila sobre a cama e, debaixo, um par de
tênis surrados. Um videogame empoeirando sobre a estante. Um toca fitas desconectado
da tomada, mas com o sintonizador do volume no máximo. Um passe de ônibus, ida
e volta. Dá o braço a torcer, ainda precisa da volta. Um porta retratos com uma
foto de 8 anos atrás. A cama arrumada, fria. Um cachorro, que agora precisa esperar
a luz do sol percorrer toda a extensão do quarto, vazio. Uma força invisível
executando, transformando, construindo. A força motriz que, agindo hoje,
definirá o amanhã. Isso, o que se faz hoje refletirá no amanhã. Distância que a
luz demora tanto tempo para percorrer, mas que é superada instantaneamente por
uma decisão tomada em segundos. Não há tempo para olhar ao redor. O eu de
amanhã será girado para o lado que o eu de hoje quiser que ele gire. A poderosa força fantasmagórica.
Aos 90, o joelho vacila. Gostaria que os pais não tivessem que ter saído
de perto. Talvez acompanhado, provavelmente sozinho. Perde o fôlego ao levantar
da cama, assim como uma criança de 10 se cansa por escalar árvores o dia
inteiro. Uma cama com colchão amassado. Uma cômoda com uma dúzia de peças de
roupas. Desistiu do rádio, pois a dificuldade na audição incomoda os vizinhos.
Um porta retratos propositadamente tombado. Se acostumou com a imagem no
espelho, mas não é a que possui de si mesmo na memória. O sol não percorre a
extensão do quarto, a janela precisa ficar fechada, pois um vento atravessado é
um assassino a espreita. Conquistou absolutamente tudo que planejou, mas já não
acredita que as ideias foram dele. Questiona o que fez. Pensa no que deveria
ter feito. Teve tempo suficiente para olhar ao redor. Tantas coincidências,
tantas similaridades. Todos são tão iguais. Fora iludido pela dificuldade de se
medir as consequências e os resultados. Conclui que nunca houve uma força
fantasmagórica. Tudo o que sempre existiu foi a apenas a inevitabilidade de um
par de luvas.
A diferença entre a ilusão e o delírio? Depende da idade, da direção para
a qual se pode olhar. Já fui impaciente pela materialização das ilusões, época
em que as chamava de sonhos. Hoje, aguardo ansiosamente pelo cumprimento da
promessa da vovó,
de que pela manhã acordarei livre dos delírios de uma noite febril.
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