"Qualquer um que tenha violado um tabu torna-se tabu porque possui a perigosa qualidade de tentar os outros a seguir-lhe o exemplo."
Sigmund Freud
Conhece aquela história do marido super fiel, mas que possui uma esposa
muito, muito "zelosa"? Ela vive desconfiada de seu parceiro, descarregando todo o
seu ciúmes sobre ele, tratando-o como se estivesse mesmo "pulando a cerca". Um
dia ele percebe que está pagando por uma divida que não tem e sem tirar "proveito" da situação de fato. Então, o confiável marido decide fazer por merecer,
consuma a infidelidade.
Hoje eu darei motivo para ser considerado mentalmente preguiçoso, pois de
fato não vou pensar. Eu vou transcrever o que disse alguém que possui mais crédito
na esfera intelectual (interessante eu ter usado a palavra "mais", sugere que eu também
tenha crédito). As palavras que serão reproduzidas constituem parte de uma
entrevista com o filósofo Luiz Felipe Pondé para a revista Veja, na edição de 13 de
Julho de 2011 (espantou-me esse tipo de entrevista na Veja).
Como fiquei sabendo desta matéria? Eu vi uma postagem com o vídeo abaixo
que citou a entrevista. Aliás, percebam que o vídeo foi produzido pelo mesmo
filósofo. Importante, sem teoria da conspiração, não fiquei sabendo antes da
entrevista simplesmente porque não leio a Veja e não a leio por pura preguiça.
Desviando: Já que compartilhei o vídeo acima, aproveito para citar o
trecho dele que achei mais interessante, foi quando o filósofo comparou o fascismo ao plano, sabe-se lá
de quem (pertinente mencionar isso), de utilizar a escola para "orientar" as
crianças sobre escolhas de sexualidade. Nunca tinha feito essa observação.
Lembrei-me que, na minha época de criança, falar sobre sexualidade era um tabu.
Não que isso seja necessariamente o correto, mas acabei constatando que,
talvez, um tabu tenha lá sua função, o de evitar que coloquem ideias nas nossas
mentes quando ainda não pensamos a respeito, ou quando ainda não ouvimos a
opinião de pessoas que julgamos confiáveis (os responsáveis por nós, por
exemplo).
Outro exemplo de tabu pode ser a fé (não vamos falar de religião, pois é
corruptível). Dependendo do quanto você pode estar despreparado sobre esse
tema, considerá-lo um tabu o protegerá de ser influenciado por alguém que tenha
seus métodos de manipulação de "massas".
Ainda desviando: Já que falei de fé, tive outra lembrança. Certo dia pediram
para que eu fosse claro sobre o que acredito, pois diante de tanta insatisfação
com o mundo seria de se esperar que eu fosse do tipo suicida. Interessante,
pois falei justamente sobre isso com minha esposa (psicóloga) recentemente. Eu disse
a ela que, para resolver um problema insolúvel, eu acredito ser do tipo que se
suicidaria, mas que não mataria. Ela respondeu, "isso você faz mesmo". O verbo
fazer no presente bombardeou minha mente de significados mais rápido do que eu pude
citar apenas um deles.
Enfim, quais as minhas convicções? Acredito que por mais que
eventualmente eu consiga ter alguns sucessos, eu nunca conseguirei ser de fato
uma pessoa boa (já falei da escala da bondade aqui). A humanidade nunca
vai melhorar no sentido de ser. Nos milênios que se passaram nem sequer
mostramos essa tendência. Penso que a transformação só poderá vir de fora. O
ponto é, como resolver esse "pessimismo" ao invés de afogar-me em uma banheira? Sugiro
essa leitura, mas atendendo ao pedido por clareza, eu escolhi acreditar no único
Deus que, ao invés de pedir que nós O alcançássemos através de nossas forças,
ofereceu vir nos buscar. Justamente por saber de nossas limitações, Ele apareceu
por aqui como pessoa pedindo que apenas confiássemos Nele. Eu nunca tive uma
experiência sobrenatural que justificasse a minha escolha, apesar de não
conseguir explicar racionalmente algumas coisas, por isso percebi que não fui
convencido pelos feitos excepcionais, mas sim pelas palavras. A promessa por uma
realidade transformada, assim como quem acorda de um pesadelo pela manhã, é o
que mantém-me longe da banheira. Descobri que o plano não sou eu, mas que
apenas faço parte, mesmo quando há favores aparentemente em meu benefício, pois
se a finalidade fosse a minha pessoa, eu estaria apresentando-me como deus, mas
não falando Dele na terceira pessoa. Aliás, já falei exatamente disso aqui.
Voltando tudo: Acabo de perceber que, apesar de não ter fugido ao tema, pensei
demais. Há quem possa dizer que expus minha alienação, como quem solta os micos
de circo. Prolonguei-me por um assunto geralmente considerado um tabu e isso
pode sugerir uma tentativa de exercer influencia. Enfim, transcrevo as palavras
de alguém letrado e que, por isso, consegue convencer melhor de que não está querendo
convencer ninguém de nada. A única ressalva é que, diferente dele, eu acredito
que o tema transcenda a filosofia.
"Veja: Por que a política não pode ser
redentora?
Pondé: O cristianismo, que é uma religião
hegemônica no Ocidente, fala do pecador, de sua busca e de seu conflito
interior. É uma espiritualidade riquíssima, pouco conhecida por causa do
estrago feito pelo secularismo extremado. Ao lado de sua vocação repressora
institucional, o cristianismo reconhece que o homem é fraco, é frágil. As
redenções políticas não têm isso. Esse é um aspecto do pensamento de esquerda
que eu acho brega. Essa visão do homem sem responsabilidade moral. O mal está
sempre na classe social, na relação econômica, na opressão do poder. Na visão
medieval, é a graça de Deus que redime o mundo. É um conceito complexo e
fugidio. Não se sabe se alguém é capaz de ganhar a graça por seus próprios
méritos, ou se é Deus na sua perfeição que concede a graça. Em qualquer hipótese,
a graça não depende de um movimento positivo de um grupo. Na redenção política,
é sempre o coletivo, o grupo, que assume o papel de redentor. O grupo, como a
história do século 20 nos mostrou, é sempre opressivo.
Veja: Em que o cristianismo é superior ao
pensamento de esquerda?
Pondé: Pegue a ideia de santidade. Ninguém, em nenhuma
teologia da tradição cristã – nem da judaica ou islâmica –, pode dizer-se
santo. Nunca. Isso na verdade vem desde Aristóteles: ninguém pode enunciar a própria virtude. A
virtude de um homem é anunciada pelos outros homens. Na tradição católica – o
protestantismo não tem santos –, o santo é sempre alguém que, o tempo todo,
reconhece o mal em si mesmo. O clero da esquerda, ao contrário, é movido por um
sentimento de pureza. Considera sempre o outro como o porco capitalista, o
burguês. Ele próprio não. Ele está salvo, porque recicla lixo, porque vota no
PT, ou em algum partido que se acha mais puro ainda, como o PSOL, até porque o
PT já está meio melado. Não há contradição interior na moral esquerdista. As
pessoas se autointitulam santas e ficam indignadas com o mal do outro."
Essa entrevista de 2011 está mais atual do que parece. Eu vi recentemente um líder de esquerda comparar-se a Jesus Cristo (o Deus que
mencionei anteriormente).
"Veja: O senhor acredita em Deus?
Pondé: Sim. Mas já fui ateu por muito tempo.
Quando digo que acredito em Deus, é porque acho essa uma das hipóteses mais
elegantes em relação, por exemplo, à origem do Universo. Não é que eu rejeite o
acaso ou a violência implícitos no Darwinismo – pelo contrário. Mas considero que o
conceito de Deus na tradição ocidental é, em termos filosóficos, muito
sofisticado. Lembro-me sempre de algo que o escritor inglês Chesterton dizia: não há problema em não acreditar
em Deus; o problema é que quem deixa de acreditar em Deus começa a acreditar em
qualquer outra bobagem, seja na história, na ciência ou sem si mesmo, que é a
coisa mais brega de todas. Só alguém muito alienado pode acreditar em si mesmo.
Minha posição teológica não é óbvia e confunde muito as pessoas. Opero no
debate público assumindo os riscos do niilista. Quase nunca lanço a hipótese de Deus
no debate moral, filosófico ou político. Do ponto de vista político, a
importância que vejo na religião é outra. Para mim, ela é uma fonte de hábitos
morais, e historicamente oferece resistência à tendência do Estado Moderno de
querer fazer a cura das almas, como se dizia na Idade Média – querer se meter
na vida moral das pessoas.
Veja: Por que o senhor deixou de ser ateu?
Pondé: Comecei a achar o ateísmo aborrecido, do ponto
de vista filosófico. A hipótese de Deus bíblico, na qual estamos ligados a um
enredo e um drama morais muito maiores do que o átomo, me atraiu. Sou
basicamente pessimista, cético, descrente, quase na fronteira da melancolia.
Mas tenho sorte sem merecê-la. Percebo uma certa beleza, uma certa misericórdia
no mundo, que não consigo deduzir a partir dos seres humanos, tampouco de mim
mesmo. Tenho a clara sensação de que às vezes acontecem milagres. Só encontro
isso na tradição teológica."
Assumindo o risco de ser simplista demais, segundo Sartre, "o inferno são os outros", e eu passei a enxergar-me
em todos eles.
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