sábado, 25 de novembro de 2017

Por Água Abaixo

"Só uma coisa morta segue a correnteza. Tem que se estar vivo para contrariá-la."

A primeira referência a universos paralelos data de 1952 com Erwin Schrodinger. Em uma palestra, naquele ano, o físico teórico disse que as equações que lhe renderam o Nobel aparentam descrever várias histórias diferentes, mas que estas não são alternativas. Nas palavras dele, "tudo realmente acontece simultaneamente". Pelo menos ele concordou que o enunciado parece lunático.

A proposição de Schrodinger durante seu discurso foi uma Interpretação da Mecânica Quântica que, ao contrário da Mecânica Quântica em si, não é uma ciência estabelecida. Por exemplo, como se infere que existam multiversos?

Vamos tentar uma analogia. Imagine que a localização de um cão de estimação dentro de uma casa seja descrita pelas equações de Schrodinger. Se tentarmos descobrir com exatidão o cômodo onde o bicho se encontra – ou seja, se tentarmos reduzir a função de onda a partir de um estado emaranhado –, concluiremos que, enigmaticamente, o animalzinho deve estar na cozinha e no quarto ao mesmo tempo. Para sermos mais precisos que isso, seria necessário tomar a decisão de entrar na casa e procura-lo lá dentro. Porém, com essa interferência, o cachorro viria ao nosso encontro e, consequentemente, estaria no cômodo onde nós estivéssemos. Assim, com o enunciado de Schrodinger, conclui-se que vários universos existam e nós vivemos naquele cujas decisões quânticas adequadas nos trouxeram a este momento.

Desviando: Pense em um castelo de areia deixado na praia. O vento sopra e, grão a grão, o castelo vai se desfazendo. Em algumas horas, ou no máximo poucos dias, não há mais nenhum rastro da pequena construção. Mas, seria possível que o vento também colocasse novos grãos nos locais corretos, de modo que o castelo não se desmanchasse, ou até mesmo aumentasse em complexidade? Matematicamente é possível sim, mas qualquer um que já tenha brincado na areia sabe que isso é astronomicamente improvável. Então, fico imaginando que interpretação daríamos para os castelinhos se, ao invés de crescermos construindo-os, tivéssemos aprendido a matemática por trás deles primeiro.

Voltando: Não coincidentemente, foi pensando na questão "o que eu faria se fosse você?" que acabei recordando esses conceitos sobre universos paralelos. Inevitavelmente, a minha resposta convergiu para "eu faria exatamente a mesma coisa que você, já que eu seria você".

Há uma grande diferença entre ser aquecido na água desde o começo e ser lançado na panela com a água já borbulhando. Todos os sapos morrem igualmente, se aquecidos junto com a água. E todos eles pulam da panela também igualmente, se jogados na água fervendo. Já falei de sapos em água quente aqui e aqui, mas com outro enfoque.

Todas as outras pessoas foram, são e serão minhas vidas alternativas. Somos todos os universos paralelos uns dos outros. Todos os lances sorteados. Todas as conjunturas, todas as alternativas e todas as escolhas possíveis distribuídas sobre a mesa. Olhe para qualquer um e veja a si mesmo. É exatamente você lá, sob aquelas circunstâncias, diante daquelas alternativas e fazendo as mesmas escolhas.

Desviando: "Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; cada ser humano é uma parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não pergunte por quem os sinos dobram; eles dobram por ti."


Voltando: Frente a isso, talvez tenhamos que rever nossos julgamentos, se é que temos direito de possui-los. Mesmo assim, não nos esqueçamos que compreender não é sinônimo para apoiar. Se nossos olhos foram abertos de alguma forma, se é que o foram de fato, não temos o direito de rotular, mas temos o dever de indicar o mesmo colírio que nos sugeriram.

"Você diz: Estou rico, adquiri riquezas e não preciso de nada. Não reconhece, porém, que é miserável, digno de compaixão, pobre, cego e que está nu. Dou-lhe este aconselho: Compre de mim ouro refinado no fogo e você se tornará rico; compre roupas brancas e vista-se para cobrir a sua vergonhosa nudez; e compre colírio para ungir os seus olhos e poder enxergar."


A vida é uma enchente e, arrastados pela correnteza, estamos todos tentando nos agarrar aos galhos que existem pelo caminho. Alguns poucos, quase se afogando, conseguiram segurar em alguma coisa, mas, agora, ao invés de ajudar os demais a também se ancorarem, ficam gritando para quem passa submergindo, "vocês deveriam ter feito aula de natação". Estique o braço, esteja você dentro da água, ou fora dela.