quinta-feira, 15 de março de 2018

No Meio do Caminho Havia uma Pedra

"Os homens tropeçam por vezes na verdade, mas a maior parte torna a levantar-se e continua depressa o seu caminho, como se nada tivesse acontecido."


O Dr. Enéas Carneiro fez alguns cálculos muito interessantes neste vídeo. Considerei tão provocativo que resolvi colocar neste texto. No entanto, minha citação está ligeiramente diferente da explanação dele, uma vez que precisei fazer pequenas correções.

Os 23 pares de cromossomos humanos possuem em torno de sete bilhões de nucleotídeos. Considerando que cada nucleotídeo representa uma única unidade de informação (um bit), chegamos à conclusão de que nosso DNA possui sete bilhões de bits. Sabendo que uma letra de qualquer alfabeto pode ser codificada com sete bits, de acordo com o "Código Padrão Americano para o Intercâmbio de Informação", o DNA humano poderia codificar um bilhão de letras. Se tomarmos as seguintes médias, que uma palavra possui em torno de seis letras, que a página de um livro tem em torno de 200 palavras e que um bom livro tem em média 300 páginas, chegamos ao incrível resultado de que nosso código genético possui informação suficiente para preencher 2778 livros de 300 páginas. Não estamos falando de livros com rabiscos, mas sim de códigos que possuem um significado, informação, dados. E lembre-se, isso é o código fonte apenas dos seres humanos. O Dr. Enéas encerra o raciocínio dele dizendo, "eu me recuso a acreditar que isso é o acaso; eu tenho o direito de recusar".

Desviando: Matematicamente falando (já citei isso aqui), mutações ao acaso destroem muito mais informação no DNA do que constroem algo útil. Seria mais fácil eliminar a vida do que dar origem a novas espécies. É comparável a retirar, acrescentar e substituir palavras de um dicionário, aleatoriamente, esperando que um dia ele se torne uma enciclopédia. Pode até ser que ele chegue lá, mas bem antes terá deixado de ser um dicionário.

Voltando: Somando o vídeo da palestra do Dr. Enéas a outras situações que vou expor logo em seguida, percebi que quando paramos para prestar atenção, acabamos tropeçando em algumas verdades.

Veja, por exemplo, o caso de uma cantora bem popular atualmente. Ela disse, nessa entrevista, que  "loucos são os que abandonam seus sonhos para viver de aparência", que "seu padrão é você e não a sociedade". Nesta outra entrevista, ela disse que apoia a diversidade, em resposta a seguinte pergunta, "como é ser inspiração para outras mulheres, especialmente negras e gordas, que até pouco tempo tinham que lidar com um padrão de beleza que tem mais a ver com a Europa do que com o Brasil?". Porém, dias atrás, ela fez um ensaio fotográfico e, entre outras fotos, tirou essa aqui:


Poxa vida, eu confesso que esperava mais gordinhas e gordinhos na foto, depois de todos aqueles discursos. Achei que há muito padrão de beleza europeia nesse enquadramento.

Não estou interessado se ela está correta ou errada, não estou questionando o talento dela – perceba que não coloquei aspas na palavra cantora dois parágrafos atrás –, não estou colocando em cheque as motivações dela, tampouco atrevendo-me a julgar o merecimento. O que eu estou querendo expor é que as mensagens nem sempre são o que parecem. A parcialidade sempre serve a um propósito. Aliás, pelo menos no caso da cantora, o objetivo é bem fácil de identificar.

Chesterton trata muito bem de convicções parciais em seu livro Hereges. Ele questiona os eruditos ingleses de sua época, por concluírem que os nativos de Mumbo Jumbo acreditavam que os mortos se alimentavam na jornada para além-vida, já que colocavam comida ao redor do defunto durante o funeral, sempre sob os olhares críticos dos sacerdotes. Ele percebeu que tal dedução era tão absurda quanto concluir que acreditamos que os mortos sentem cheiro, uma vez que temos o hábito de rodeá-los com flores, também durante o funeral, sob o olhar de senhoras perturbadas cujas coroas estão atrasadas.

Desviando: Chesterton percebeu que a divisão entre ritualistas e não-ritualistas é uma distração que serve a um propósito. A realidade é a divisão entre ritualistas conscientes e  ritualistas inconscientes. O primeiro grupo é muito simples e fácil de compreender, o segundo grupo é o caso realmente pesado e complicado. Exemplos nas palavras do próprio autor – meus esclarecimentos entre colchetes.

"O motivo secreto que leva uma tribo selvagem a adorar macacos ou a lua não pode ser descoberto, ainda que alguém ande entre tais selvagens e tome nota das respostas num caderno, ainda que o mais inteligente dos homens possa seguir tal caminho. A resposta está na Inglaterra; está em Londres; mais ainda, está no próprio coração. Quando alguém descobrir porque os homens na Bond Street usam chapéus pretos, descobrirá, no mesmo instante, porque os homens em Tombuctu usam penas vermelhas."

"O que pode ser mais solene e absurdo, se considerado em abstrato, do que simbolizar a existência do outro sexo retirando uma parte da vestimenta e fazendo um aceno?" [levantar o chapéu para uma senhora que passa]

"Qualquer um com talento poético admitirá que, para o instinto humano comum, o pão simboliza algo que não pode ser facilmente simbolizado de outra forma. Mas gravatas brancas ao anoitecer são um ritual, e nada além de um ritual" [pois não significam nada].

G. K. Chesterton

Voltando: Enfim, se caminhando por uma praia, víssemos na areia seis letras formando uma palavra, imediatamente concluiríamos que um ser inteligente esteve ali antes de nós. Se captássemos códigos ordenados vindo do espaço, chegaríamos a conclusão inequívoca de que não estamos sozinhos no Universo. Ironicamente, tropeçamos no código mais impressionante (em conteúdo e em composição) que já foi constatado, o DNA, mas só conseguimos associá-lo ao acaso. Ou não queremos enxergar, ou nossas convicções parciais estão servindo a um propósito. Aliás, uma coisa não exclui a outra, necessariamente.