quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Dá o Pé, Loro!

"Ninguém é mais escravo do que aquele que se julga livre sem o ser."

A complexidade irredutível define que um sistema biológico complexo não poderia ter surgido gradativamente, uma vez que cada um dos fragmentos que compõe o conjunto sejam imprescindíveis para a manutenção do próprio sistema. Imagine que um automóvel, exatamente nos moldes da tecnologia atual, tenha surgido peça a peça. Para facilitar, vamos nos concentrar no último item. O automóvel está pronto, mas a bomba de combustível ainda não foi criada. Porque tudo o que envolve a injeção de combustível teria surgido sem que uma bomba tenha sido idealizada? Qual função teria o veículo? Ele nem mesmo poderia receber o nome de automóvel. Agora imagine que se não funciona, ele não fica lá parado, aguardando o surgimento da última peça pelos próximos séculos, mas desaparece, "morre" e não dá origem a outros carros, pois sua existência depende de estar completo. Pois bem, esse é o conceito, ou o carro surge pronto, ou não há um automóvel.

Voltemos à biologia para entender como isso se aplica a nossa existência. O que teria se desenvolvido primeiro, o sangue, ou o mecanismo de coagulação? Se o sangue veio primeiro, quantas gerações foram necessárias até que o mecanismo de coagulação fosse desenvolvido? Como a vida se sustentou até lá? Ou ainda, o que veio primeiro, os gametas, que unindo-se dão origem a uma nova vida, ou os sistemas reprodutores masculino e feminino? Quem surgiu primeiro, o macho, ou a fêmea? Caso um deles tenha surgido primeiro, como nos reproduzimos até o aparecimento da outra metade? Percebe que a chave e a fechadura só tem função se surgirem juntos? E pior ainda, que se não surgirem juntos não há próxima geração? Há centenas de exemplos, desde as estruturas mais simples até as mais complexas, mas para não prolongar demais, o que veio primeiro, as proteínas que sintetizam o DNA, ou o código genético que possui a receita das proteínas? Quem foi o precursor, a informação através de códigos ou o processo de escrita?

Desviando: Sabe qual é a probabilidade de uma proteína com comprimento de 100 aminoácidos ser construída combinando-se 20 tipos de aminoácidos diferentes na ordem correta? Uma chance em vinte elevado a 100. Os matemáticos consideram qualquer evento impossível de ocorrer quando as chances são menores que uma em dez elevado a 50. Segue a referência.

Voltando: Além da dependência por funções vitais, observando o detalhe no qual baseia-se o processo evolucionista, outro ponto a ser superado seria a estatística. Se milhões de mutações aleatórias ocorrem antes que uma mutação benéfica apareça, o que produzem aquelas que não são imediatamente fatais e que acabam sendo transmitidas adiante? As mutações deletérias, sob o aspecto estatístico, excedem em muito o número de mutações benéficas. Isso inevitavelmente culminaria na progressiva deterioração de uma espécie e seu eventual desaparecimento.

Gostaria de fazer uma ressalva, não estou questionando aquelas modificações genéticas dentro de uma espécie que cooperam para a adaptação ao meio em que está exposta, mas estou indagando se seria realmente possível que uma "bactéria" se tornasse um ser humano apenas por seleção natural. Devo confessar, levantar essa dúvida não é meu verdadeiro objetivo também, mas esse debate serve bem como pano de fundo.

Foi então que fiquei elucubrando sobre as possíveis motivações de um ateu. Tentei concluir se ele baseia sua opinião na razão ou na fé? Por algum motivo, uma premissa para ser considerado ateu é basear-se exclusivamente na razão (sonho com o dia em que alguém desmistifique isso). Fiquei pensando nas perguntas levantadas na primeira parte deste texto. Elas podem ter respostas racionais, mas nem todos os céticos as conhecem, sem considerar que nossos cientistas não tenham todas também. Neste caso, acreditar na ciência porque confiamos que ela tem, ou terá, as respostas é fé, mas não razão. Todos, sem exceção, baseiam suas vidas na fé mais do que imaginam, ou mais do que podem aceitar de si mesmos.

Por algum motivo, algumas pessoas tem problema com a palavra fé. E fiquei pensando que talvez eu tenha também. Por exemplo, eu acho necessário ter muita fé para ser ateu, então acabo acreditando em Deus. De qualquer forma, fé parece mesmo estar associada a divindades. Pense comigo, um ateu tem fé na ciência, criada pelo Homem, enquanto eu tenho fé em Deus que, segundo os ateus, também foi criado pelo Homem. Portanto, segundo a lógica ateísta, tanto ele quanto eu temos um mesmo deus, o Homem. Porém, somente segundo o meu ponto de vista as divindades seriam diferentes. Para mim, o ateu continua com fé na ciência, que foi criada pelo Homem, enquanto eu, desta vez, acredito em Deus, que criou o Homem.

Desviando: Já vi carros nas ruas com o seguinte adesivo, "Nas Mãos de Deus".  Eu fiquei pensando, o proprietário do veículo sabe o que implica estar nas mãos de Deus? Considerando que ele seja cristão, tomando o exemplo de vida de Jesus, se o automóvel está nas mãos de Deus, não é coerente que esteja servindo a interesses particulares. Antes, esperar-se-ia que o automóvel estivesse servindo a outras pessoas, geralmente necessitadas, ou, quem sabe, estivesse disponível para tornar cada vez mais conhecida a mensagem de Deus. Pois eu concluí que, se o proprietário usa o veículo como qualquer outra pessoa do mundo utiliza um bem particular, o adesivo seria apenas um talismã para o carro, talvez um tipo de proteção contra acidentes, assaltos, roubos, enchentes, multas etc. Inclusive, já falei da tendência de resumir Deus a um amuleto aqui.

Não diferente, também já vi alguns automóveis com um adesivo, "Nas Mãos de Darwin". Novamente, questionei-me se o dono do veículo sabia que tipo de mensagem ele estaria passando para uma pessoa mais atenta. No caso de ser eu quem está lendo o adesivo, vejo duas possibilidades. A primeira, o proprietário do automóvel não sabe o que implica dizer estar nas mãos de Darwin, mas só está querendo ser considerado alguém bem racional, pois a imagem do cientista parece estar associada a esse tipo de aspecto, por alguma razão. Neste caso, o dono do adesivo é apenas uma pessoa de muita fé, que acredita em algumas coisas mesmo que não saiba bem a explicação delas, ou até se seriam verdadeiras mesmo. A segunda possibilidade, o dono do carro, de fato, sabe a mensagem que está passando e quer que eu fique ciente disso. Nesta situação, eu tenho medo desse cara e jamais vou atravessar a rua enquanto ele pilota o automóvel. Para explicar melhor meu medo:

"Entre os selvagens, os fracos de corpo ou mente são logo eliminados; e os sobreviventes geralmente exibem um vigoroso estado de saúde. Nós, civilizados, por nosso lado, fazemos o melhor que podemos para deter o processo de eliminação: construímos asilos para os imbecis, os aleijados e os doentes; instituímos leis para proteger os pobres; e nossos médicos empenham o máximo da sua habilidade para salvar a vida de cada um até o último momento... Assim os membros fracos da sociedade civilizada propagam a sua espécie. Ninguém que tenha observado a criação de animais domésticos porá em dúvida que isso deve ser altamente prejudicial à raça humana. É surpreendente ver o quão rapidamente a falta de cuidados, ou os cuidados erroneamente conduzidos, levam à degenerescência de uma raça doméstica; mas, exceto no caso do próprio ser humano, ninguém jamais foi ignorante ao ponto de permitir que seus piores animais se reproduzissem."

Charles Darwin – "The Descent of Man", 1871

Voltando: Às vezes, usamos alguns argumentos para apoiar uma crença em detrimento de outra, mas são medidas apenas convenientes, nós não acreditamos necessariamente neles e também não nos damos conta disso. Tão perigoso quanto um homem que usa a fé das pessoas para controlá-las, é o homem que usa a ignorância intelectual delas para o mesmo fim. Um homem com um livro de ciências na mão pode ser tão tirano quanto um homem com uma bíblia.

Eu sempre acreditei no evolucionismo, mas em determinado momento eu passei a considerar a matemática, a física e a química no mesmo bolo da biologia. Foi então que não tive mais tanta fé assim em Darwin. Nesse dia, inclusive, percebi que eu agi como Tomé, eu só passei a acreditar por que vi.

Obviamente, todos temos a liberdade de acreditar no que quisermos. Todos podemos ter fé ou não tê-la, mesmo que precisemos de fé para isso. Porém, nós testamos nossas ideologias, estudamos os conceitos e as implicações de cada posição e ideia que assumimos? Nós conhecemos os pontos fortes e fracos de nossa "filosofias" e sabemos onde elas falham e onde acertam? Elas são mesmo as posições que queremos ter diante do mundo e das pessoas? As mensagens que passamos adiante com nossas palavras e com nossos atos estão coerentes entre si? Ou somos apenas papagaios domesticados, repetindo incansavelmente sons que agradam aos ouvidos de nossos mestres sem sabermos o que significam? Enfim, quem são nossos mestres e o que eles ensinam?


sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Feliz Ano Novo, Feliz Vida Nova

"Rezemos para que a raça humana jamais escape da Terra para espalhar sua iniquidade em outros lugares."

Começando com um desvio: Essa primeira parte foi inserida após o texto ter sido concluído. Depois que terminei de escrever esse post, percebi que tenho sido bem pessimista com relação a nós, a humanidade. De fato, já havia percebido isso há mais tempo. Tinha desistido desta publicação e estava tentando escrever algo mais animador, mais motivador. Havia ficado preocupado, ou eu conseguiria fazer você ficar tão baixo astral quanto eu tenho estado, ou você deixaria de ler o meu blog. Obviamente, nenhuma dessas duas opções me agrada. Então, pretendia voltar a falar um pouco de física, matemática e filosofia, como em outros momentos. Até tenho algo rascunhado já. Porém, após ficar sabendo da música que promete ser o hit do carnaval de 2017, de ver mais atentados e massacres e de ver a foto de mais um bebe refugiado afogado, eu não consegui. Não dá para não ser pessimista. Ah, sobre a música, não vou citá-la, pois é cheia de palavras vulgares e de obscenidades. Para se ter uma ideia, uma emissora solicitou uma versão mais light para poder transmiti-la. Caso você ainda não a tenha ouvido, tenho certeza que ouvirá, pois essas coisas sempre conseguem se espalhar.

Agora sim, começando pra valer: Um setor que vem crescendo a cada ano, conquistando cada vez mais adeptos, é a autoajuda. Segundo essa reportagem, entre janeiro e setembro de 2015 foi registrada uma queda de 2,8% no volume de vendas de livros, em comparação ao mesmo intervalo do ano anterior. Porém, os livros de autoajuda, apresentaram no mesmo período um aumento de 5,9% nas vendas. Eu particularmente acredito que esse sucesso se dá por um motivo principal, não estamos conseguindo lidar com o fato de não podermos tornar real o parque de fantasias que estamos construindo. Se não gostou da alegoria, leia esse texto.

Salvo raríssimas exceções, o que todo mundo busca ao ler um livro de autoajuda é a felicidade individual. Deve existir, mas confesso que ainda não vi um livro sobre como tornar a vida de sua(eu) companheira(o), ou familiar, ou amigo(a) mais feliz. Tudo bem, confesso que não procurei. No entanto, no universo do que nos alcança sem exercermos algum esforço, eu poderia listar uma dezena de livros sobre a busca pela própria felicidade, mas nenhum pela felicidade do outro. Para mim, isso já é suficiente. E para piorar, como disse anteriormente, a felicidade é algo que construíram, que está lá fora e que prometeram que podemos alcançar. Bem, se você viveu a vida toda e não conseguiu, não conquistou, ou não alcançou, você deve ter sido mesmo uma pessoa bem infeliz, ou quem sabe, nunca leu um livro de autoajuda.

Deixando a ironia de lado, enquanto buscava dados sobre o tema, encontrei uma publicação bem lúcida sobre o assunto. Quase que eu a classifiquei como autoajuda, mas como a abordagem sugerida não gera resultados rápidos, não contém os dez passos diários de um homem de sucesso, não contém os sete pensamentos que se deve evitar para ser plenamente amado, e muito menos a fórmula para se conquistar o mundo com o estralar dos dedos (poxa, eu disse que tinha deixado a ironia de lado neste parágrafo), eu preferi colocar o link na pasta "vale a pena ler novamente de tempos em tempos" e desclassificá-lo como "autoajuda".

Desviando: Recentemente, um vendedor ambulante foi assassinado ao tentar defender um morador de rua homossexual. Dois homens perseguiam a vítima com o intuito de espancá-la, sabe-se lá por qual motivo, mas dá para imaginar. O vendedor, presenciando o ocorrido, tentou intervir, acabou virando alvo dos dois selvagens e foi morto. Ao ver essa notícia, eu fiquei pensando, a única pessoa da história que tentou defender o interesse alheio morreu. Imaginemos que a autoajuda pudesse prever o futuro, que tipo de conselho ela teria dado ao vendedor antes do ocorrido? Teria dito para ele fazer o que fez e sinto muito, mas não há um futuro promissor a sua frente? Teria dito que ele deveria ser mais individualista, deixasse que os outros resolvessem os próprios problemas, só assim ele alcançaria felicidade, conquistas e sucesso? O que a autoajuda teria a dizer ao vendedor e a sua família? Ela tem o poder de reparar essa ferida? É reparável? Que receita de felicidade há para quem não terá mais seu pai e seu marido ao seu lado?

Voltando: Confesso que minha sensação é que temas de autoajuda são para pessoas que não estão precisando de ajuda, mas sim para aqueles que só estão buscando um "tapinha nas costas", um "vai lá tigrão, você consegue", ou alguns "confetes" lançados sobre si. Que fique claro que é só a minha opinião, diga-se de passagem, uma péssima opinião (desta vez não fui irônico). Sem falar que sou do tipo que lê livros de autoajuda, ou pelo menos lia.

Nós homens não somos capazes de alcançar e viver a plena felicidade. Tudo o que esse mundo pode e nós mesmos podemos oferecer são apenas ilusões. Nem este mundo, nem ninguém poderá oferecer a felicidade que eu realmente quero. No máximo, conseguirei viver tentando fazer com que a tristeza seja a menor possível para mim e para as pessoas ao meu redor.

Aliás, sabe o que me entristece profundamente? Que o sol nasce para bons e maus eu até aceito. Não tenho problema em tolerar que os maus se deem bem. Difícil para mim é conformar-se de que o bons se deem mal. Isso dói de verdade.

Foi inevitável, busquei encontrar um único bom motivo para continuar tentando ser moralmente bom nessa vida. Quem sabe seja para levar adiante o legado da minha família, sem denegrir a minha imagem e nem o meu sobrenome. Besteira, daqui a duas gerações, talvez três no máximo, a minha existência terá sido limitada a registros de nascimento e casamento em um cartório. Talvez um possível motivo seria construir um mundo bom para as gerações futuras, para perpetuação da espécie, mas para quê? Um dia, um asteroide nos atingirá, ou o sol nos queimará, ou um supervulcão vai entrar em erupção, ou algum evento cataclísmico irá nos dizimar, isso se nós não nos destruirmos antes. Então, para que postergar o fim? Ah já sei, um bom motivo para continuar sendo moralmente bom seria para evitar problemas. Que problemas? Os verdadeiros canalhas se dão bem sempre, ou pagam para não se darem mal.

Pode não parecer, mas eu sou um cara esperançoso, beirando a utopia. Talvez seja a fonte dos meus dilemas. Cheguei a seguinte conclusão, eu quero um mundo em que interesses pessoais não tenham vez. Se existir somente uma chance desse mundo existir, eu vou me agarrar a isso até o final. Minha esperança é que a plenitude venha de fora. É a  nossa única saída, pelo menos sob minha ótica. Por sorte (minha) alguém um dia, uma única pessoa em toda a história dos seres humanos, reconheceu nossas incapacidades, não nos julgou por isso, mas nos prometeu transformar tudo, bastasse que tivéssemos esperança (na verdade fé). Como disse, sou esperançoso, agarrei-me a isso, acreditando que a verdade existe, independente se acreditamos nela ou não.



"Nossos corações humanos esquecem como são fortes
Se perdem no longo caminho
Não é desistir, é se desapegar
E para ir a um lugar melhor"

Neste ano que começou, eu cogitei uma meta nova, a de iniciar uma terapia. Talvez até tomar alguma medicação que venha a ser necessária. Quem sabe assim, tudo fique bem e resolvido, já que o problema deste mundo só pode ser eu e meu pessimismo.