terça-feira, 27 de outubro de 2015

Um Passo do Tamanho da Perna

"Suba o primeiro degrau com fé. Não é necessário que você veja toda a escada. Apenas dê o primeiro passo."
Martin Luther King


Pensando em uma frase do último post, "o correto, mesmo que pelos motivos errados, talvez baste" e também após uma conversa com um colega de trabalho sobre um professor de filosofia avesso a regras, foi que eu tive a inspiração para esse texto. (Inspiração? Esse negócio de escrever está subindo pra cabeça.)

Eu sei que estamos no Outubro Rosa, mas vou falar de outro tipo de doença que acomete as mulheres, o câncer de colón de útero. Esta enfermidade está relacionada diretamente ao vírus HPV e as estimativas 2014/2015 do INCA (Instituto Nacional de Câncer) giram em torno de 16.000 novos casos anuais no Brasil. As principais formas de contágio são início precoce da atividade sexual, elevado número de parceiros sexuais, parceiro com vida promiscua, baixa da imunidade, tabagismo e más condições de higiene. Como um método de prevenção, o Ministério da Saúde implementou no calendário vacinal, em 2014, a vacina contra o HPV para meninas de 9 a 13 anos de idade. Outro fator para reduzir os riscos de contaminação pode ser a circuncisão. Um estudo realizado em Uganda, de 2003 a 2006 e publicado pelo "The Lancet" em 2011, indicou que as parceiras dos homens circuncidados foram 28% menos propensas a serem infectadas com o vírus do HPV do que as parceiras dos homens não circuncidados.

Desviando: Eu julgo que existem três coisas que movem um ser humano em seu caminho, a obediência, a consciência e o instinto. Já citei aqui a diferença entre uma criança que é apenas obediente a ordens e uma criança que é consciente porque já ralou o joelho no chão. Poderíamos falar também da tentativa de explicar para uma criança os motivos pelos quais ela precisa comer verduras e legumes. Ela poderá até entender as explicações, mas ainda assim continuará comendo salada porque é uma ordem e não porque é uma escolha. Apenas com o amadurecimento intelectual, a escolha passará de obediência para consciência. Porém, quando madura, ainda há a possibilidade do instinto falar mais alto. Aquele adulto, mesmo que consciente, talvez prefira reforçar estímulos neurais que lhe dão prazer a atender a voz daquele "anjinho", que fica em cima de seu ombro direito, suplicando ao ouvido para que preste atenção na distribuição das cores no prato.

Voltando: Em um dos livros do Pentateuco, escrito aproximadamente 3.000 anos atrás, mais precisamente em Levítico capítulo 12, versos de 2 a 3, a circuncisão foi estabelecida como lei para os hebreus. Todos os meninos, ao oitavo dia do nascimento, deveriam ser circuncidados como sinal de que pertenciam ao povo de Deus. Diferente do que se possa imaginar, aquela lei não foi criada naquele período de tempo, ela já existia antes, mas era considerada apenas como uma regra, até que Moisés a registrou no livro das leis dos hebreus. A origem da regra data de aproximadamente 4.000 anos, quando Deus prometeu a Abraão que criaria uma nação a partir de sua descendência e pediu para que ele estabelecesse a circuncisão como um sinal desta promessa. Aqui vale um paralelo. O que transforma um grupo de pessoas em uma nação? Uma cultura ou modo de vida em comum, um conjunto de leis e também uma terra. Historicamente, a terra está sendo disputada até hoje.

E por que a circuncisão deveria ser realizada ao oitavo dia do nascimento? Bem, isso não foi explicado por Deus, ou pelos hebreus em seus livros. Era apenas uma ordem que deveria ser cumprida. Porém...

"Com base na consideração das determinações de vitamina K e de protrombina, o dia perfeito para se realizar uma circuncisão é o oitavo dia." (citação de "Nenhuma Dessas Doenças", Dr. S. I. McMillen, 1986, pág. 21, em inglês).

A vitamina K é também conhecida como vitamina anti-hemorrágica e a protrombina é um elemento de coagulação sanguínea, ou seja, seguir a regra do oitavo dia ajudava a evitar o perigo de hemorragia, isso segundo os conhecimentos contemporâneos.

Os hebreus, em seu início como povo há 4.000 anos, possuíam bagagem técnica ou intelectual suficientes para entender a relação da circuncisão com a saúde pública da época? Eles sabiam o que era profilaxia? Ou melhor, já tinham consciência de que algumas doenças poderiam ser causadas por maus hábitos de higiene? Eles conheciam doenças sexualmente transmissíveis? Ao menos conheciam o organismo feminino? Sabiam o que era um útero e quais as consequências de uma higiene masculina inadequada? Será que aprenderam com a observação? Quantos anos foram necessários para que a observação deixasse a relação entre higiene e saúde tão clara em suas mentes? Onde os resultados dessas observações teriam sido registrados para que geração após geração fosse possível chegar a derradeira conclusão? Minha opinião é que eles não passavam de crianças que não sabiam os motivos pelos quais deveriam comer saladas. Eles eram mais obedientes do que conscientes.

Desviando: Alguém estava além do tempo e sabia que um povo, que estava tentando se estabelecer como nação, não poderia se dar ao luxo de ter suas progenitoras mortas ou estéreis e também seus genitores dizimados por maus hábitos de higiene. Em uma época tão remota, cuidados simples poderiam fazer toda a diferença entre a evolução de um povo e o seu completo extermínio. Alguém sabia que a humanidade ainda não tinha uma consciência evoluída e que naquele período da história ela deveria apenas ser obediente. Esse alguém, além de ter claro o conceito de medidas profiláticas, de saúde e de medicina há 4.000 anos atrás, também conhecia a psicologia humana e suas limitações. Assim como um pai sabe como lidar com uma criança a cada fase de sua evolução, esse alguém soube quando foi necessário apenas estabelecer regras. A questão que fica é, quem? Um viajante do tempo? Um ser extraterrestre, arquiteto da vida e da humanidade? Uma consciência (ou inconsciente) coletivo? A mãe Natureza? Talvez um único homem muito sábio? Quem sabe Deus? Não será hoje que falaremos disso. Aliás, acho que não será em outra ocasião também, pois já falei bastante sobre escolhas em outros textos.

Voltando: Por mais que nos esforcemos, não é possível conscientizar todo mundo a usar o cinto de segurança. Não é possível fazer com que todos decidam pela escolha certa só porque é a escolha correta a se fazer. Sempre será necessário limitar por baixo. Será necessário definir regras e leis.

"CTB - Lei nº 9.503 de 23 de Setembro de 1997
Institui o Código de Trânsito Brasileiro.
Art. 167. Deixar o condutor ou passageiro de usar o cinto de segurança, conforme previsto no art. 65:
Infração - grave;
Penalidade – multa de R$ 127,69;
Medida administrativa - retenção do veículo até colocação do cinto pelo infrator."

Existe um relato que me deixa muito, muito curioso. Aliás existem dois relatos que me deixam muito inquieto. É como se eu quisesse acordar de um sonho, mas não conseguisse. Em determinado momento Jesus é questionado por Pilatos sobre o que é a verdade, mas fica em silêncio. (Poxa vida, não fique em silêncio. Por favor, responda. Não me deixe com essa curiosidade.) Em outro momento, aliás anterior a esse que citei primeiro, Jesus diz que há muito o que dizer, mas que não podemos suportar agora. (Ah! O que não estamos enxergando? O que é demais para nós?)

Enfim, existem momentos que tentar explicar os motivos pelos quais ele não deve deixar a toalha molhada em cima da cama não vai resolver. Na maioria das vezes, ela não irá entender porque não pode "investir" em sapatos usando aquelas economias que foram poupadas para uma emergência. Muito provavelmente sua vovó nunca vai entender porque você não gosta de carregar o guarda-chuva, e a experiência dela nunca será suficiente para convencê-lo de que muitas dores de cabeça podem ser evitadas ao se proteger de uma chuva. Não haverá itens suficientes na lista de boas ações de seus amigos que possam convencer seu pai de que eles são "maneiros", assim como você nunca conseguirá imaginar seu pai como um adolescente em uma roda de amigos, cercado de todo tipo de pessoas, fazendo exatamente o que você faz hoje e por isso conhecendo todas as desculpas que você pode dar. Nestes momentos e em outros, algumas regras deverão ser estabelecidas, a relação deverá ser definida de acordo com critérios de obediência, mas não de consciência, e todos teremos que estar conscientes pelo menos disso.

Não dá para explicar tudo sempre. Existirão momentos que você terá que simplesmente mandar ou obedecer, confiar. E se não o fizer, terá que lidar com as consequências. Não vai dar para culpar a ciência, a religião, os homens maus (ou até os bons) ou o mundo sempre. Quando não há evolução, seguir ordens pode ser o suficiente, ou pelo menos deveria ser o primeiro passo.

Menção: Abraço ao RS, colega de trabalho com que troquei algumas ideias sobre as regras serem ou não serem relevantes.

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