sábado, 17 de outubro de 2015

Teto de Vidro

"Eu temo pela minha espécie quando penso que Deus é justo."
Thomas Jefferson

Para começar esse texto, lembrei-me da narrativa de Marcelo Gleiser em "O Fim da Terra e do Céu – O Apocalipse na Ciência e na Religião" que descreve a queda de um cometa há 65 milhões de anos, teoria mais aceita no meio científico para explicar a extinção dos dinossauros. Transcrevo as partes mais interessantes.

"(...) com um diâmetro estimado de dez quilômetros, viajou ao encontro da Terra com a velocidade de vinte quilômetros por segundo, atravessando a maior parte da atmosfera em menos de dois segundos. A temperatura do ar à sua frente, comprimido a pressões enormes, atingiu temperaturas por volta de cinco vezes mais altas do que a temperatura na superfície do Sol. (...) A energia liberada pelo impacto foi (...) 10 mil vezes maior do que a energia que seria liberada se todas as bombas termonucleares armazenadas no clímax da guerra fria fossem detonadas simultaneamente. (...) o bólido cavou uma vala de quarenta quilômetros de profundidade e duzentos quilômetros de diâmetro (...) Terremotos como nós nunca presenciamos, atingindo dez pontos na escala Richter, fizeram tremer o solo por centenas de quilômetros, causando o desmoronamento da costa e mais maremotos. Quando atiramos uma pedra em um lago, observamos que a colisão é seguida por um pico central, cuja altura aumenta com a energia do impacto. O impacto que dizimou os dinossauros foi tão violento que uma coluna de água e rochas elevou-se até a metade da distância entre a Terra e a Lua, despencando com uma fúria terrível, que devastou uma área de milhares de quilômetros quadrados. (...)

Qualquer ser vivo a uma distância de centenas de quilômetros do ponto de impacto foi (...) vaporizado. (...) a milhares de quilômetros, os animais viram um clarão luminoso de incrível intensidade acompanhado por uma sucessão de tremores de terra devastadores. A onda seguinte de destruição foi causada pelos detritos que caíam dos céus, que queimaram áreas de dimensões continentais. (...)

(...) Europa, África, Ásia e América do Sul (...) sofreram as consequências secundárias do impacto, nem por isso menos fatais. Uma enorme quantidade de poeira foi suspensa na atmosfera, como se milhares de vulcões houvessem entrado simultaneamente em erupção (é possível que alguns tenham entrado). A poeira espalhou-se pela atmosfera superior, bloqueando completamente a luz do Sol por meses: a escuridão era total e a temperatura global caiu de maneira dramática. (...) Com as chuvas, a poeira em suspensão foi lentamente removida e a temperatura começou a subir. A maior parte do solo ao redor do local de impacto era composta de pedra calcária, rica em carbonato de sódio. O calor gerado pelo impacto decompôs o carbonato, que se combinou com o oxigênio para formar o dióxido de carbono (...), o excesso de dióxido de carbono e vapor d’água em suspensão aprisionou o calor do Sol junto à superfície terrestre por milhares de anos. Para completar o horror, o nitrogênio e o enxofre (...) combinaram-se com o oxigênio e o hidrogênio, formando quantidades enormes de ácido sulfúrico e ácido nítrico, os quais retornaram a Terra em chuvas ácidas que duraram décadas."

Desviando: É estranho pensar que a consciência não seja uma consequência intrínseca da evolução, pois os dinossauros dominaram o planeta por 100 milhões de anos sem nunca a terem desenvolvido. As poucas espécies de mamíferos que sobreviveram ao cataclismo tiveram a sua chance de evoluir e adquiriram consciência em um intervalo de tempo bem menor, aproximadamente 65 milhões de anos. Aqueles seres que provavelmente não passavam de uma boa refeição aos grandes répteis foram moldados e lapidados pelas condições que o planeta Terra ofereceu a partir de então e, por alguma razão, um dia se perguntaram, "quem somos nós?" Falei um pouco sobre a teoria da evolução de Darwin neste post. (Pensei agora como algumas coisas são repetidas tantas e tantas vezes que acabamos nos esquecendo de que ainda há algumas dúvidas e de que tudo não passa da melhor explicação que se consegue dar até o momento).

Voltando: Se a regra da evolução descrita por Darwin é favorável aos mais adaptados, por que não continuamos o que a Natureza começou a partir da queda daquele meteoro? Por que não continuamos a usar a força para superar aqueles que estão no nosso caminho? Por que não limpamos a casa, não eliminamos quem está a margem do sistema que construímos? Eu consigo pensar em duas respostas. Primeiro, a definição de força está atrelada a estrutura do ambiente onde o ser está inserido, por tanto eliminar pode ter vários significados. Coloque um empresário muito bem preparado e de sucesso em uma reunião de negócios e espere para ver quem irá "sobreviver". Depois, coloque esse mesmo empresário de frente com um leão em um campo aberto e faça as suas apostas. Consequentemente, chego a segunda resposta, nós fazemos isso, nós eliminamos.

Mas por que eliminar? As condições que se apresentam já não são por si só demasiadamente difíceis de superar? Dizer que a lei da sobrevivência do mais adaptado está associada a definição de força na ocasião do meio em que o ser está inserido, significa dizer que ela está associada aos recursos disponíveis. Portanto, a lei que Darwin "descobriu" existe em qualquer meio onde os recursos são escassos. Finalmente, o caminho de menos esforço é eliminar as fontes consumidoras e não aumentar a disponibilidade de recursos. De forma inconsciente, sem saber explicar muito bem, nós sabemos disso e aplicamos em tudo, desde as estratégias para obter um cargo melhor (uma única vaga para vários concorrentes), até na luta pelas moedas para os pães da padaria (aliás, não compro pães com moedas há muito tempo).

Assim como a consciência não é resultado inequívoco da evolução, poder se perguntar "quem somos nós" também não significa que as regras irão mudar, tendo em vista que continuamos a construir estruturas que eliminam os "fracos" e privilegiam os "fortes". Nós criamos um mundo de possibilidades, mas colocamos preço em tudo. Um pai ou uma mãe levam o seu filho a uma praça no final de semana e com a mesma sensação de nó na garganta como se o estivessem segurando pelas pontas dos dedos para impedi-lo de cair de um penhasco, abrem a carteira e tentam apanhar as únicas moedas que tem na carteira para poder atender ao desejo da criança de ganhar um balão de ar, mesmo sabendo que agora terão que caminhar alguns quilômetros para voltar para casa. Por que não conseguimos resolver esse tipo de situação? Tente responder.

Desviando: Imagine que uma empresa não se preocupa com a saúde de seus funcionários. Se ela passasse a se preocupar, o gasto dela seria 50.000 reais a mais por ano. Agora imagine que a cada dez anos a probabilidade é que apenas um funcionário entre com uma ação contra a empresa (eu estou chutando alto). Nesse caso, a empresa deverá desembolsar 200.000  reais ao funcionário. Se a cada dez anos um funcionário ganhar uma causa contra a empresa, ela terá economizado 30.000 reais por ano, ou 300.000 reais em dez anos, ao escolher em não investir no bem estar de seus funcionários. O que nos impede de usar o mesmo raciocínio para a decisão de fazer o que é certo sem ganhos, contra o que não é cem por cento digno com ganhos? (Tem uma escala para dignidade?)

Voltando: Por que eu deveria ajudar o pai e a mãe do garoto a voltar pra casa? Talvez porque serei castigado no pós-vida se eu não for bondoso, ou talvez para colocar no currículo que sou engajado com ações sociais. Puro pragmatismo. O correto não seria ser bondoso por que faz parte da minha natureza? Mas não faz parte da minha natureza. Opa... Parece haver outro conceito de evolução, mas que estamos considerando menos importante do que o conceito de evolução de Darwin, pelo menos é o que inferimos do jardim que temos construído, bem como dos frutos das árvores plantadas.

Eu não consigo me lembrar onde eu li, ou de quem eu ouvi essa frase:

"As palavras obrigado e por favor foram criadas por que acreditamos que somos donos de algo."

Se eu perdesse o emprego, não tivesse como pagar minha casa e fosse despejado, se não tivesse com o que comprar comida, pagar minhas contas e passasse a ser um morador de rua, o que eu gostaria que um estranho que está vivendo sua vida padrão fizesse por mim? Pois é, está cheio de Andrés nessas situações por aí e eu estou aqui vivendo minha vida padrão como um estranho. Talvez eu esteja sendo utópico demais e entre o tudo e o nada, quem sabe o correto, mesmo que por motivos errados, seja o suficiente.

Enfim, o cometa que vai provocar o próximo apocalipse não vem de cima. Ele está gradualmente sendo construído aqui embaixo e sendo catapultado para o alto, pela "grande" e atual "espécie dominante". Enquanto ele sobe, as vezes alguns escombros menores se desprendem e atingem o solo causando consequências desesperadoras como redução de margens de lucro, quedas nas vendas, altas no dólar, inflação, desvalorização de bens, bolhas estourando, corrupção à tona, calores e frios extremos, atentados, queimadas, inundações etc. Quando a grande pedra cair, ela vai derrubar o castelo de areia. A minha maior curiosidade é saber quem serão os "insignificantes" e "marginalizados" seres que irão sobreviver e ter a sua chance de dominar o planeta. Eu sei que é clichê terminar assim, mas... a casa vai cair. Ela caiu todas as vezes na historia das grandes potências, por que seria diferente desta vez? E agora será como foi para os dinossauros, será global.


2 comentários:

  1. Vai sair um documentário legal sobre esse tema de dinossauros e possibilidades. Discute sobre a possibilidade de caso o meteoro não atingisse a Terra. A relação social e antropológica das espécies. Bem cabeça. É meio filosófico mas a linguagem é fácil de entender. Vai sair dia 07 de Janeiro. Acredito que seja uma possibilidade que poderia se tornar quase verídica... Esse é o trailer: https://www.youtube.com/watch?v=A6z79w5fdDU

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    1. Bem legal, Luciano. Vou seguir a sugestão e ver o filme. Ainda bem que a linguagem é fácil, vou precisar. HAHA Brincadeira... Não, não é brincadeira, vou precisar mesmo. Abraço.

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