domingo, 27 de dezembro de 2015

Olha a Onda, Olha a Ondaaa

"Todo o homem luta com mais bravura pelos seus interesses do que pelos seus direitos."
Napoleão Bonaparte


O telefone celular foi inventado em 1947 pelo laboratório Bell, nos Estados Unidos. Em 1973, a Motorola lançou a primeira geração (1G) de celulares, o DynaTAC 8000, mas ele só passou a ser comercializado dez anos mais tarde. Em 1991, com a primeira transmissão de sinais 2G, já foi possível se comunicar através de mensagens SMS. Em 2001, no Japão, foi lançada a rede 3G. Em 2007 a Apple lança o iPhone, em um formato que revolucionou a aparência de todos os aparelhos que seriam lançados a partir de então. Em 2008, a Google lança o sistema operacional Android, o mais utilizado até o momento. E finalmente em 2010, foi lançada a tecnologia 4G.

Os telefones celulares estão tão avançados em suas tecnologias, que existe até uma piada sobre o assunto. Quando alguém lista para outra pessoa os recursos de seu aparelho, termina observando que ele também faz ligações telefônicas. Para termos uma boa ideia da capacidade disponível em nossas mãos, o computador de bordo da espaçonave de Neil Armstrong tinha apenas 2kb de RAM. Isso remete a outro raciocínio, alguns homens com um computador de 2kb nas mãos foram os primeiros humanos a pisarem na Lua, outros bilhões de pessoas com celulares de 1 a 2Gb de RAM tornaram-se especialistas no compartilhamento de fotos, vídeos e piadas.

Conversando com alguns amigos sobre os altos preços dos aparelhos hoje em dia, chegamos a conclusão de que não se vendem celulares há muito tempo. O que se vendem são interesses. O "querer" não tem preço. Ao semear um interesse na minha mente, uma empresa pode fazer com que eu pague um preço exorbitante por algo que vai além das minhas necessidades. É algo muito parecido com aquele discurso sobre São Paulo, por exemplo: "Eu gosto de São Paulo, porque se você quiser comer em um restaurante Tailandês as duas horas da manhã, você tem essa possibilidade". Convenhamos... Em 11 milhões de habitantes, aposto que é possível contar nos dedos o número de pessoas que um dia saíram durante a madrugada procurando um restaurante Tailandês (desconsiderando os desejos de grávidas). Somos capazes de passar uma vida inteira pagando por algo que nunca iremos precisar. Por quê? Simplesmente porque plantaram mais que uma ideia nas nossas mentes, plantaram um interesse.

Desviando: Um colega de trabalho compartilhou uma observação muito interessante que um bombeiro lhe fez certo dia. Tomo a liberdade de adaptá-la do universo fabril para a vida cotidiana. Todos os dias ficamos sabendo de acidentes de carros nas ruas e nas estradas. Em alguns casos, as vítimas não conseguem se desvencilhar sozinhas das ferragens que sobraram dos automóveis, mas precisam de ajuda de pessoas especializadas. Já em segurança, quando os sobreviventes tem a oportunidade de encontrar os bombeiros que fizeram o resgate, não há palavras que podem expressar o agradecimento pelo ato de salvamento dos oficiais. Em contra ponto, quantas vezes ouvimos pessoas reclamando de autoridades ao serem multadas por não usarem o cinto de segurança, ou por dirigirem após tomar uma lata de cerveja, por exemplo? Indústria da multa? Por que quem me segura ao cair de uma escada salva a minha vida e quem me alerta para tomar cuidado com o degrau é um chato? Não basta salvar minha vida, tem que ser do meu jeito. Quem colocou essa ideia na minha cabeça?

Voltando: Algumas semanas atrás foi divulgado um vídeo na internet com o seguinte título, "Meu corpo, minhas regras" (clique no link, veja o vídeo). Alguns atores famosos narram o que parece ser quase um poema, pró aborto. As justificativas para a prática não são apresentadas de forma tão explícita, mas é possível inferir que seria desde um estupro até o fato de simplesmente não querer ter o filho. As palavras são muito bem usadas, alguns assuntos, inclusive religiosos, são citados de forma que quem não está a par dos detalhes pode tomar o falso por verdadeiro. Damos a isso o nome de falácia. Não chega a ser um sofisma, pois não acredito que a intenção de quem produziu o vídeo tenha sido enganar. Acredito que eles tenham mesmo aquela opinião.

Um dia já julguei e condenei pessoas que são a favor do aborto, mas hoje não faço mais isso. Acredito que só quem passa por qualquer situação sabe o que o leva a tomada de decisão. Tampouco quero entrar no mérito sobre o que é certo ou errado, se é que há algum mérito nisso. O que quero destacar é ter percebido que eu mesmo não tinha a minha opinião sobre o assunto. Então, fui pesquisar e descobri este outro vídeo, apresentando dados que sugerem (ou provam?) que aborto é uma estratégia de países desenvolvidos para estabelecerem controle populacional sobre países em desenvolvimento (veja o vídeo).  Será mesmo? "Meu corpo, minhas regras" não passa de interesse, não de pessoas simples, que vivem seu dia-a-dia simples, mas de alguém ou algo maior? Os atores do primeiro vídeo só fazem parte do plano, mesmo sem saberem? O ideal não é deles? Pelo menos esse último vídeo parece se preocupar mais com o que as mulheres precisam e menos com o que elas querem, ao contrário do primeiro.

Ocorreu-me um sentimento de impotência muito forte. Quanto das minhas vontades, dos meus interesses e dos meus ideais não são meus? Será que eu apenas estou sendo levado pela onda? Nesse caso, qual a onda correta? Percebi que uma ótima estratégia para qualquer plano é semear desejos, vontades, interesses, pois eles dignificam atos. Já ouvi alguém dizer, "se eu quero, eu posso, se eu posso, então faço". Os dias, os meses e os anos vão passando e temos cada vez mais dificuldade em encontrar argumentos contra o "eu quero".

Nós somos muito suscetíveis, podemos ser controlados, ao mesmo tempo em que batemos no peito, orgulhosos por acreditar que estamos lutando por "nossos interesses". Será que não passamos de marionetes? Talvez por isso alguém resolveu dizer que as perguntas movem o mundo, mas não as respostas. Só espero que isso também não seja apenas mais uma estratégia de controle.

"Wilson Fisk: Acha que essa divagação na internet mudará alguma coisa?
Ben Urich: As pessoas buscam a verdade, não importa onde a encontrem.
Wilson Fisk: Pode ter sido o caso quando éramos jovens. Este mundo ao nosso redor está preocupado com casamentos de famosos e vídeos de gatos. Assuntos complicados, assuntos que importam... Eles requerem muita concentração. Tomam muito tempo para serem compartilhados por mensagens de celular (...).
Ben Urick: Acho que tenho mais fé na humanidade.
Wilson Fisk: Cristo também teve, se me recordo."

Demolidor – Temporada 1 Episódio 12 (2015)

Como saber qual deve ser o meu interesse? Qual o ideal que merece ser almejado? Se eu tivesse o poder de convencê-lo a não querer alguma coisa, ou a mudar de ideia, o que você escolheria? Como reconheceria o que não merece sua atenção e seu esforço? Se reconhecesse, escolheria não desejar? Escolheria mudar de ideia?

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