domingo, 6 de março de 2016

A Culpa é das Estrelas? Ou das Montanhas?

"O homem superior atribui a culpa a si próprio; o homem comum aos outros."
Confúcio


Eu já ouvi e li inúmeras explicações sobre o Universo, várias vezes. A observação que quero fazer é que cada uma delas pareceu estar correta, mesmo quando aparentemente se contrapunham umas as outras. Como podem estar corretas todas as explicações ao mesmo tempo? Importante alertar que não estou tentando ser irônico e nem criticando.

Certa vez, vendo o canal Discovery Science, um dos episódios da série Grandes Mistérios do Universo, com Morgan Freeman, explorou uma explicação sobre as fronteiras do Cosmo. Se não estou enganado, o nome do episódio era "Existe uma borda no Universo?".

Desviando: Não peça para eu repetir a explicação daquela teoria, não conseguirei. Se bem que, de acordo com a teoria do Macaco Infinito, que eu já mencionei aqui, um macaco, de frente a um computador, digitando letras aleatoriamente e infinitamente, um dia irá repetir toda a explicação do episódio melhor do que eu jamais conseguirei entender.

Voltando: O ponto alto do episódio foi quando mencionou-se que algumas teorias apontam para um Universo exatamente igual ao jogo Asteroids do Atari (é, eu sei, foram bem longe, mais precisamente 1979). Naquele jogo, quando a nave comandada pelo jogador atravessa o topo da tela, ela sai na parte de baixo, e quando atravessa a tela à esquerda, ela sai do lado direito. Então, a teoria é de que se você seguir em linha reta pelo espaço, você vai acabar voltando para a Terra, mas do outro lado (considerando um Universo estacionário). Aquelas teorias provam isso.

Também já ouvi uma explicação de que o Universo seria apenas o resultado de processamentos executados em níveis quânticos (já falei disso aqui e a matéria sobre essa teoria você pode conferir aqui). Não é isso, mas uma analogia que ajuda a imaginar o que estão tentando explicar é pensar em um computador. Os cálculos e os dados sendo processados nos circuitos da máquina seriam o nível quântico, enquanto o Universo equivaleria ao que se vê na tela do computador. Por exemplo, o Universo teria um limite de processamento equivalente a velocidade da luz, por isso que o tempo desacelera para um corpo movendo-se a esta velocidade, "o software começa a dar umas travadas". Tudo também fazendo muito sentido matematicamente.

Um último exemplo de explicação que quero compartilhar sugere que o Universo é um holograma (confira a matéria sobre essa teoria aqui). De forma resumida, um holograma é uma imagem em duas dimensões contendo todas as informações necessárias para representar o objeto em três dimensões. Então, o Universo não seria tridimensional, mas bidimensional, com todos os dados suficientes para que seja interpretado possuindo uma dimensão a mais. Segundo os cientistas, todas as observações realizadas enquadram-se matematicamente nessa teoria e ela ainda ajuda a resolver o maior problema científico atual, eliminar os paradoxos entre o universo quântico e o universo macro. Acredito que a afirmação "tudo encaixa-se matematicamente" é suficiente para também considerarmos essa teoria como muito plausível.

Desviando: Já ouviu falar que uma imagem vale mais que mil palavras? Pois bem, imagine que o Universo é o cilindro da figura abaixo. Minha opinião é que cada uma das explicações que encontramos são as sombras projetadas embaixo e na lateral. Com qual delas conseguimos dizer qual é o formato correto do objeto?


Voltando: Seria bem óbvio que, nesse momento, eu denegrisse a imagem da ciência e agisse de forma fanática dizendo que apenas a religião, mais especificamente a minha crença, possui as respostas que o homem procura (deveríamos estar procurando algo?). Porém, nós vamos pensar um pouco sobre esse assunto também (agora sim, definitivamente, fui óbvio).

Como eu não conheço outra religião, vou usar como pano de fundo aquela que conheço. Vamos supor que você acredite que a Bíblia seja o conjunto ideal de regras e padrões, divinamente inspirada. O que você faz? Você tenta seguir tudo o que está lá, "ao pé da letra"? Você tenta interpretá-la para se adequar as suas capacidades? Ou é meio a meio, alguns textos devem ser praticados de forma inequívoca, outros devem ser interpretados?

Se você decidisse que o que está escrito tem que ser seguido "ao pé da letra", pois só assim você não será condenado, eu responderia, "perdeu playboy!" (gíria "barra pesada"). Não há, nunca houve (com uma única exceção) e nunca haverá um ser humano capaz de cumprir tudo o que está escrito lá. E se uma única virgula não for cumprida, será como se você não tivesse cumprido todas as outras regras? Já falei aqui sobre a instintiva e equivocada tendência que temos em acreditar que existe uma escala de zero a dez para o erro e para o mal.

A segunda opção seria interpretar os textos, mas nesse caso qual seria a interpretação correta? Como saber quando um mais um não significa dois? Enfim, por eliminação, vamos pelo caminho do meio a meio, algumas coisas "ao pé da letra", outras interpretadas. Porém, quem decide? Quem pode fazer distinção entre o que deve ser interpretado e o que deve ser seguido a risca?

O ponto é que, tanto na ciência quanto nas questões morais, nós achamos que sabemos das coisas. Achamos que temos o controle, mas não temos. Formulamos diversas explicações lógicas e tantas regras, pois não suportamos aquela sensação como da água escapando por entre os dedos. Neste vídeo aqui, eu ouvi Ravi Zacharias contando um história, aparentemente uma parábola oriental. Transcrevo-a abaixo.

"O cavalo de certo homem fugiu. Então seu vizinho apareceu e falou, 'que má sorte, o seu cavalo fugiu', ao que o homem respondeu, 'e o que eu sei de boa  ou má sorte?'.

Alguns dias depois, o cavalo voltou com 20 outros cavalos selvagens. Então o vizinho disse, 'impressionante, não foi má sorte, mas boa sorte, pois agora você tem tantos outros cavalos', mas o homem novamente respondeu, 'e o que eu sei sobre boa ou má sorte?'.

Enquanto o filho do homem domava um dos cavalos novos, o cavalo atingiu sua perna e a quebrou. O vizinho insistente, 'pois é, foi má sorte mesmo, seu cavalo ter trazido todos esses outros cavalos', porém, novamente o homem disse, 'e o que eu sei sobre boa ou má sorte?'.

Alguns dias depois, um grupo de bandidos vieram à cidade para recrutar jovens para a gangue, mas ao verem o filho do homem com a perna quebrada, não quiseram levá-lo. O vizinho insistiu, 'que boa sorte o seu filho ter quebrado a perna', não diferente o homem respondeu, 'e o que eu sei sobre boa ou má sorte?'."

A nossa vida é muito diferente desta história? Nós tentamos ou não encaixar tudo dentro de um plano? Somos capazes de discernir entre o que coopera para o nosso bem e o que coopera para nosso mal? Um ônibus que demorou para chegar, um voo que adiantou, um troco que foi entregue errado, um pneu furado, uma entrevista de emprego que não passamos, outra que somos aprovados, uma negociação que deu certo. O que veio depois de cada uma dessas situações e o que viria caso tivessem sido diferentes? Quem pode saber?

Desviando: "Assim, porque você é morno, mas nem frio, nem quente, estou a ponto de vomitá-lo da minha boca". Apocalipse, capítulo 3, verso 16

Já ouvi dezenas de explicações sobre esse trecho e todas pareceram-me muito corretas, analogamente as diversas explicações sobre o Universo. Cada uma delas uma projeção diferente da verdade. Da mesma maneira, gostaria de contribuir com minha parcela. Talvez esse trecho do livro de Apocalipse aponte também para o fato de que temos que tomar nossas decisões não porque está escrito, não porque alguém mandou, não porque vamos nos dar mal, não porque a teoria diz, não porque está de acordo com o plano. Deveríamos fazer nossas escolhas por simplesmente acreditar que são as escolhas que nós deveríamos fazer. Temos que entregar a nossa consciência, temos que assumir a responsabilidade.

Voltando: Há outro trecho, também da Bíblia, onde é mencionado que se tivéssemos fé do tamanho de um grão de mostarda, nós poderíamos dizer a uma montanha para mover-se de lugar e ela obedeceria. Eu fiquei pensando, o que faríamos com uma fé do tamanho completo então? Cheguei à conclusão que talvez percebêssemos que as montanhas não são um problema, mas o problema é a nossa mania de culpá-las por tudo, sem falar das estrelas. Está mais do que na hora de fazermos as nossas escolhas e de nos responsabilizamos por elas, conscientes de que todas e qualquer uma não serão mais do que sombras nas paredes, pois será o mais próximo que conseguiremos chegar da verdade.

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