sábado, 25 de agosto de 2018

Por Que a Galinha Sobe a Escada?

"O sucesso tem sido sempre um grande mentiroso."

Já ouviu aquela história do rapaz que trabalhava como empacotador em um caixa de supermercado? Com o passar do tempo, ele foi melhorando gradativamente o processo de embalar as compras. Ele desenvolveu meios mais rápidos de empacotar os produtos, descobriu maneiras de embrulhar os pacotes de forma que facilitassem o carregar, evoluiu no trato com os clientes, era sempre prestativo e não faltava um dia sequer ao trabalho. De fato, um ótimo exemplo de profissional e, como ele mesmo dizia, muito feliz.

O jovem destacou-se de tal maneira que seu superior imediato o promoveu a cobrador em um dos caixas do supermercado. O chefe decidiu que era hora do empacotador dar o próximo passo na busca pelo sucesso. O rapaz não negou, pois nunca negaria qualquer trabalho, ainda mais quando havia associada uma promessa por mais felicidade. Porém, na nova função, ele não teve o mesmo desempenho como empacotador. O trabalho executado foi de baixa qualidade, eram muitas as dificuldades. Passados alguns meses, após muita ajuda e muitas chances, não houve outra saída senão demitir o rapaz. Parece que havia alguma questão legal que impedia um retrocesso de função. Infelizmente, o supermercado perdeu o melhor empacotador que possuía e agora tinha as filas aumentando nos outros caixas.

Quando o jovem foi questionado sobre o motivo pelo qual seu rendimento não teria sido tão bom na função de caixa como fora na de empacotador, a resposta foi simples: "Eu não sei o motivo porque não consegui me sair bem, o que sei é que eu gostava muito de empacotar mercadorias. E eu ainda tinha tantos planos para colocar em prática naquela primeira função."

Pensando nesse caso, lembrei-me que, frequentemente, usa-se a imagem de uma escada como uma metáfora para representar a trajetória em busca do sucesso. Mas quem fez essa comparação pela primeira vez? E por quê? Hoje, quando atento a essa analogia, fico com dúvidas sobre nossos objetivos profissionais. O sucesso é em si a resposta, o fim último almejado? Ou ele é o meio para viabilizar outro objetivo?

Desviando: É curioso como alguns padrões parecem ficar mais claros, ou até mesmo demonstram-se loucos, quando fazemos comparações com situações mais simples e familiares.

Voltando: Quando morava junto com meus pais, tínhamos uma escada em casa que dava acesso a uma lavanderia, em um nível superior. Fiquei imaginando o que eles pensariam se um dia, perguntando-me porque subi a escada, eu respondesse algo diferente de: "Para chegar a lavanderia". O que pensariam, se eu respondesse, por exemplo: "Subi a escada apenas para alcançar o último degrau. Escadas sempre nos exortam a subi-las somente pelo fato de terem um topo."?

Está certo, concordo. Alguém poderia dizer que na vida profissional o topo é inalcançável e essa seria uma motivação suficiente. Pois ainda acho que meus pais estranhariam muito se eu dissesse que precisássemos permanentemente acrescentar degraus a nossa escada, de forma que continuássemos tendo motivos para escalar a mesma, já que sobe-se uma escada pelo fato de não se poder alcançar o último degrau.

Desta maneira, a busca pelo sucesso profissional não seria melhor representada pelo processo de lapidação e polimento de uma pedra preciosa, ao invés do subir de uma escada? Com esta nova comparação haveria um objetivo representado e nela caberiam pessoas que desejam evoluir tanto vertical quanto horizontalmente. Haveria espaço para todos, sem chance para que se colocasse em dúvida pontos como ambição, comprometimento, engajamento, profissionalismo etc.

Penso que estamos fazendo jus àquela piada: "Por que a galinha atravessa a rua?" E cuja resposta é: "Para chegar ao outro lado." (Já dei outro enfoque para essa mesma piada aqui). No nosso caso, por que a galinha subiria a escada?


Sabe que, pensando bem, começo a concordar com a imagem da escada comparada a nossa busca pelo sucesso. Se ela não representa bem o que deveria ser, pelo menos mostra claramente o que tem sido.

Ou quem sabe, a pergunta correta seja tão óbvia que deixamos de pensar sobre ela: o que é o sucesso? Nós temos mesmo o péssimo hábito de achar que temos as respostas apenas porque consideramos algumas ideias muito familiares (já falei disso aqui também).

Fazendo uma última comparação, talvez o sucesso seja como a cadeira de Clarice Lispector, no conto "Tempestade de Almas": "Quem terá inventado a cadeira? Alguém com amor a si mesmo. Inventou então um maior conforto para seu corpo. Depois os séculos se seguiram e nunca mais ninguém prestou realmente atenção a uma cadeira, pois usá-la é apenas automático."