segunda-feira, 25 de maio de 2015

É Receio que Estrague, ou Não é Seu?

"Estamos usando nosso cérebro de maneira excessivamente disciplinada, pensando só o que é preciso pensar, o que se nos permite pensar." José Saramago

Segundo a teoria da evolução, o nosso cérebro se aprimorou ao longo de milhares de anos em complexidade e conteúdo, especificamente de dentro para fora, de forma que sua estrutura reflete os estágios dessa evolução.

Dentro do cérebro, o tronco cerebral representa o passado mais antigo, onde as funções biológicas básicas para a manutenção da vida são controladas, por exemplo, o batimento cardíaco e a respiração. Ao redor do tronco cerebral encontra-se o complexo R (de réptil), fonte da agressão, do ritual, da territorialidade e das hierarquias sociais. Mas não é por associação com o comportamento de um jacaré que esse nome foi dado (apesar desta relação existir), foi porque essa parte do cérebro se desenvolveu há centenas de milhares de anos nos répteis. Depois do complexo R, tem-se o sistema límbico, a parte mamífera do cérebro, fonte dos humores, emoções, da preocupação e cuidado com nossa espécie. Finalmente, na parte mais externa, tem-se o córtex cerebral que representa dois terços de toda a massa cerebral e foi formado a dezenas de milhares de anos, onde se encontra a intuição, a análise critica, a matemática, a música, a escrita, a fala... a consciência.

Nesse trecho de vídeo encontra-se tudo o que eu acabei de dizer. Quando tiver um tempo, veja o vídeo todo. Eu gostei bastante, apesar de discordar pontualmente de algumas coisas.

Desviando: Há muito tempo alguém me contou uma história, ou eu li em algum lugar. Não lembro direito.  Um macaco se tornou humano por um dia e aprendeu tudo sobre nós. Como falamos e como nos relacionamos. Aprendeu sobre nossas criações, nossa cultura. Aprendeu como moldamos o mundo ao nosso redor de acordo com nossas necessidades, ou de acordo com o que queremos. Aprendeu que estamos, ou pensamos que estamos, no topo. Aprendeu a ler, a usar computadores, a dirigir. Aprendeu sobre nossos sentimentos, amor e ódio, sobre nossas dores e alegrias. No fim das 24 horas, após ter se tornado um humano completo, voltou a ser macaco e enfrentou o maior de seus desafios. Como contar aos outros macacos tudo o que ele viu e aprendeu? Como fazê-los entender? Com fazê-los acreditar no que eles poderiam ser?

Voltando: Nós e nossa sociedade somos um produto do cérebro? Ele é um ser supremo, escondido, manipulador, preocupado apenas com a perpetuação de sua "espécie cérebro", fazendo uso de uma luva, de uma carcaça, apenas como um meio, uma ferramenta, para moldar o exterior de acordo com suas necessidades? Se for isso, ele tem obtido sucesso, basta dar uma pensada rápida em toda a evolução da humanidade e suas sociedades. Egípcios, Maias, Gregos, Romanos, Idade Média, Idade Moderna, Hoje e por aí vai. Quantos cérebros existiram no passado e quantos existem hoje? O que era a nossa sociedade e o que ela é hoje? Tudo produto do cérebro?

Quando pensamos em um dedo, uma mão, ou em um coração, é fácil e rápido chegar a conclusão de que são partes controladas, apenas seguidores de ordens. Mas quando falamos do cérebro? Ele segue ordens, ou dá ordens? Desejos, prazeres, sentimentos, decisões, planejamento, liberdade, controle, sociedade, consciência. Somos nós mesmos que puxamos o gatilho? Ou são apenas artimanhas de um conquistador?

"Liz Kline: Ele não está tomando decisões?
Dr. Norton: Sim e não. Na vida cotidiana, homens como o Alex tomam decisões. Mas quando ele está em batalha, o visor desce e o software entra no controle, a máquina faz tudo. O Alex é só um passageiro que está de carona.
Liz Kline: Se a máquina está no controle, então quem puxa o gatilho?
Dr. Norton: Quando a máquina luta, o sistema manda um sinal para o cérebro, assim ele pensa que está fazendo o que o computador faz. Alex acredita que ele está no controle. Mas não está, é só uma ilusão de livre arbítrio.
Liz Kline: Droga. Você criou uma máquina que acha que é um humano? Mas isso é ilegal.
Sellars: Não, não. É uma máquina que acha que é Alex Murphy. E a meu ver, isso é legal."
Robocop

Ou o cérebro também não passa de uma ferramenta? Há algo além dele, que o domina, o controla, que manda as ordens e toma as decisões e que apenas precisa de um hardware para que o software seja executado? Se essa for a verdade, não fique tão animado. Considerando que  tudo que foi desenvolvido, construído, toda a evolução da humanidade e de sua civilização nos últimos milhares de anos não passou de busca pelo conforto, de um lugar melhor, mais limpo e mais confortável para que a armadura possa durar mais tempo, então o verdadeiro "eu" é um ser bem egoísta e principalmente superficial.

De um jeito não temos o controle, somos passageiros, peças. De outro jeito nossas ações demonstram que um possível inefável "eu" está preocupado apenas com a roupa que veste. Não quer que ela doa, não quer que ela se esforce, não quer que ela envelheça, não quer que ela padeça. Caprichos?

É angustiante, não temos a resposta, nunca teremos, ou um dia quem sabe teremos. Eu tenho a esperança de que um dia teremos a resposta. OK, não faz sentido ter essa esperança, mas faria mais sentido não ter? Não são apenas duas faces de uma mesma moeda?

Desta vez não vou dizer que nós precisamos fazer escolhas, vou dizer que só precisamos entendê-las. Por quê? Porque o primeiro passo para a cura é aceitar que se está doente. Quem sabe assim possamos ser algo melhor hoje do que fomos ontem. (lembra dos macacos que não subiam a escada sem mesmo saber porque?)

"Oráculo: Doce?
Neo: Você já sabe se vou pegar?
Oráculo: Eu não seria um oráculo se eu não soubesse.
Neo: Mas se você já sabe, como eu posso fazer uma escolha?
Oráculo: Porque você não veio aqui para fazer a escolha. Você já a fez! Você está aqui para entender porque fez essa escolha.
(...)
Oráculo: Você a vê morrer?
Neo: Não.
Oráculo: Você tem a visão agora, Neo. Você está olhando para o mundo sem tempo.
Neo: Então por que não posso ver o que acontece com ela?
Oráculo: Nunca podemos ver além das escolhas que não entendemos.
Neo: Você está dizendo que eu tenho que escolher se Trinity morre ou vive?
Oráculo: Não, você já fez essa escolha. Agora você tem que entendê-la."

Matrix Reloaded

Pensemos no que acreditamos e em como temos nos comportado. Nós acreditamos ser, ou nos comportamos como, uma peça, uma engrenagem? Apenas fazemos parte do plano, seja lá qual for o plano e quem o coloca em prática? Ou nós (o que quer que o "nós" signifique, ou onde que quer o "nós" habite de fato) vivemos o controle, damos as ordens, estamos além de apenas sacos de carne com medo de sangrar?

Pensemos em como estamos vivendo, no que estamos fazendo, como nos sentimos, o que nossos atos dizem por nós. É bem possível que vivamos uma coisa, mas digamos que acreditamos em outra, e mesmo assim estejamos sendo sinceros. Somos inocentes? Só não queremos turbulência? Ou somos de fato peças? Entendamos a escolha que já fizemos faz um bom tempo e avaliemos se nos tornamos quem gostaríamos de ser, ou quem deveríamos ser. E finalmente, depois de entender nossas escolhas, podemos deixar tudo como sempre foi, ou resolver tirar o brinquedo da caixa.

2 comentários:

  1. Na minha opinião o cérebro manda e obedece...
    Desde Descartes essa discussão sobre a dicotomia mente-corpo tem levantado muitas questões, muitos pontos de vistas baseados em muitas teorias.
    Mas pensemos na prática como funciona.
    Somos hoje fruto do ambiente que crescemos. Um bebê "normal" tem a sua formação neurológica desde o ventre materno, através de estímulos enviados pela sua mãe na gestação, sejam eles uma boa alimentação, exercícios físicos, o amor, carinho, dedicação que são elementos fundamentais para a concepção de uma boa qualidade neural nas sinapses.
    Desde o ventre materno recebemos estímulos comportamentais e psicológicos, respondemos ao mundo de forma consciente e inconsciente.
    Uma reflexão:"Posso deixar tudo como sempre foi", se isso não me incomodar, afinal de contas...foi como eu aprendi a lidar com o mundo, ou posso "resolver tirar o brinquedo da caixa" para ver como ele funciona. Podemos pensar: Posso continuar vivendo essa vida ou "vidinha" que aprendi a viver conforme minhas experiências subjetivas ou posso "tirar o brinquedo da caixa", ou seja, posso fazer uma autoavaliação com ajuda de um profissional e ver como se brinca e como esse "brinquedo" funciona na versão atualizada.

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    1. De fato, qual é a linha que separa o que somos em função do externo e o que somos em função do interno? Da primeira maneira, como podemos responsabilizar as pessoas, se tudo não passa de consequência do externo? Da segunda maneira, como garantimos que de fato temos algum controle? Pois sempre vivemos em conflito entre razão e instinto. Quem sabe a nossa própria tentativa de abrir os olhos para enxergar o que é real e não sombra, conforme Platão mencionava, não seja um método de controle também. Não consigo deixar de pensar no Mágico de Oz que ficava repetindo a Dorothy: "não preste atenção no velhinho atrás da cortina." É tudo muito loco.

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