"A moral é uma, os pecados são diferentes."
No programa Café Filosófico da TV cultura, transmitido no dia 08 de setembro, Leandro Karnal falou sobre o
sociólogo e filósofo Zygmunt Bauman. Em determinado
trecho da palestra ele disse: "Pós-modernidade significa a falência das metanarrativas amplas. Metanarrativas são narrativas vastas,
gerais que dão sentido a todas as coisas que eu posso entender. Exemplo
clássico, a Bíblia. Explica tudo de onde veio, tudo como está e tudo para onde
vamos. A Bíblia não explica a história do povo judeu, ou a história dos
primeiros cristãos. A Bíblia diz, no princípio criou Deus o céu e a terra. E no
final, no Apocalipse, último livro do Novo Testamento, a Bíblia encerra isso. E
essas metanarrativas bíblicas tiveram concorrentes. A partir do século XVII e
XVIII, o Iluminismo. A partir do século XIX, o Marxismo. E a partir do século XIX e XX, o Idealismo. Todas essas metanarrativas são universais. E agora
nós passamos a viver o fim das narrativas do tipo metanarrativas. Não há mais
explicações gerais. As narrativas passam a ser curtas, tópicas. Só têm valor
para mim. Surge o indivíduo que rejeita a Bíblia, a Ilíada, a Odisseia. Surge o individuo que rejeita Shakespeare e diz: 'Nada
disso vale, eu penso diferente.' (neste momento Leandro Karnal segurou a risada), característica da pós modernidade. A minha
opinião é constituidora de sentindo. O colapso da modernidade é o colapso da
razão e a ascensão da manipulação dos signos. Dessa capacidade de deslocar
sentidos para o individuo."
O conceito de Lei Natural (Direito) surgiu com o
propósito de avaliar as opções humanas no sentido de agir de modo razoável e
bom. Ou seja, surgiu com o objetivo de descrever a moral como uma regra
absoluta, inerente ao ser humano. Posteriormente, com o desenvolvimento da
ciência, a Lei Natural (Ciência) passou a representar
algum fenômeno natural que possa ser observado regularmente, como, por exemplo,
a gravidade, que nos mantém presos ao chão.
Neste texto, gostaria que focássemos apenas no sentido original da Lei
Natural. Gostaria que pensássemos sobre as colocações de Leandro Karnal, de que
verdades gerais tem sido moldadas para atender ao indivíduo.
Desviando: Se bem que, o conceito cientifico da Lei Natural também daria
um bom texto, pois, atualmente, mesmo a ciência tem sido colocada em cheque,
haja vista questionamentos recentes contra a biologia e contra a esfericidade
da Terra – para citar somente dois exemplos.
Voltando: Sendo assim, a Lei Natural, ou a moral, existe mesmo? Há o
certo e o errado independente do indivíduo?
O primeiro exemplo que podemos pensar refere-se ao conceito de contratos.
São eles que nos fazem cumprir acordos, ou é a nossa noção sobre certo e errado
que nos torna fiéis ao que foi combinado? De fato, se analisarmos com um pouco
mais de cuidado, perceberemos que contratos não possuem valor. Eles são apenas
testemunhas além do tempo e do espaço. Qualquer pessoa que ver um contrato
saberá que um pacto foi firmado e deve ser cumprido, mesmo que ela não tenha
estado presente no momento e no local do apertar de mãos. Portanto, o que nos
torna fiéis a acordos é uma lei moral de que quebrar promessas é errado. Sem
esse conceito, nem ao menos entenderíamos para que serve um contrato.
Outro exemplo, por que Hitler se armou para fazer
valer seus planos e ideais? Foi porque ele, além de ter os próprios conceitos
sobre certo e errado, também era capaz de reconhecer o julgamento alheio (dos Aliados) sobre o que eles
consideravam certo e errado. Portanto, ele se preparou para as consequências.
Se Hitler não tivesse a Lei Natural dentro de si e não soubesse que ela existe
de forma geral nos demais, ele poderia, sinceramente, não saber porque estava
sendo retalhado, ou sequer ter se armado.
E além disso, a moral vai muito mais além. Nós ficamos com raiva de uma
pessoa que propositadamente tenta nos derrubar, mesmo que ela não consiga.
Porém, absolvemos quem desastradamente e sem intenção alguma consegue nos
derrubar de fato. A moral é algo que nos faz julgar além das consequências.
Visto que a Lei Natural, ou a moral, existe mesmo, ela é absoluta ou
personalizável? O que é moralmente correto ou errado para um povo, não o é
necessariamente para outro povo? O que é correto para uma pessoa não é absolutamente
para outra?
Na maioria dos casos, não percebemos que, apesar das distintas ideias
morais entre diferentes povos e culturas, a essência da moral em si difere
muito pouco entre eles. Se é que difere.
Eu compararia a Lei Natural, ou a moral, à "menor" partícula constituinte
da matéria. O átomo é a estrutura básica, fundamental, a partir da qual todas
as moléculas são criadas e posteriormente as maiores estruturas, como pedras,
árvores e mesmo nossos corpos. Uma cultura pode considerar errado que um homem
tenha quatro esposas, mas outra cultura pode considerar correto. Esse aspecto
da moralidade é só a molécula. Porém, ambos os povos concordam que um homem não
pode ter qualquer mulher, mas apenas aquela que seja sua esposa. Sendo essa
última, portanto, o átomo da Lei Natural. Aliás, podemos ir além, e devemos, o
verdadeiro átomo só veio à tona poucas décadas atrás. Hoje um homem só pode ter
uma mulher que queira ser sua esposa.
Pois bem, feitas todas essas observações, o que eu poderia dizer sobre
nosso tempo, o da pós-modernidade? Qual a minha opinião sobre a individualização
das verdades? Desta vez fiquei feliz em perceber que, quando formei uma
opinião, alguém já a havia citado antes de mim. Aliás, tenho duas opiniões: a
primeira é a mesma risada contida como a de Leandro Karnal na citação inicial; a
segunda segue abaixo.
"Todos
sabem que o dado está viciado
Todos
lançam-no com os dedos cruzados
Todos
sabem que a guerra acabou
Todos
sabem que os caras bons perderam
Todos
sabem que a luta foi armada
Os
pobres continuam pobres, os ricos ficam ricos
É
assim que as coisas são, todos sabem
Todos
sabem que o barco está vazando
Todos
sabem que o capitão mentiu
Todos
têm esse sentimento quebrado
Como
se o pai ou o cachorro deles tivessem morrido
Todos
conversando com seus bolsos
Todos
querem uma caixa de chocolates e uma rosa de haste longa
(...)
Todos
sabem que você me ama, baby
Todos
sabem que você realmente ama
Todos
sabem que você foi fiel
Oh,
tirando uma ou duas noites
Todos
sabem que você foi discreto
Mas
havia tantas pessoas que você precisava conhecer sem suas roupas
(...)
É
assim que as coisas são, todos sabem
(...)
E
todos sabem que é agora ou nunca
Todos
sabem que sou eu ou você
E
todos sabem que você vive para sempre
Quando
você faz uma linha ou duas
Todo
mundo sabe que o negócio está podre
O
velho Black Joe ainda colhe algodão
Para
suas fitas e arcos
(...)
E
todos sabem que a praga está chegando
Todos
sabem que está se movendo rapidamente
Todos
sabem que o homem e a mulher nus
São
apenas um artefato brilhante do passado
Todos
sabem que a cena está morta
Mas
haverá um registro em sua cama
Isso
irá divulgar o que todos sabem
E
todos sabem que você está com problemas
Todos
sabem o que você passou
Da
cruz sangrenta em cima do Calvário até a praia de Malibu
Todos
sabem que está se afastando
Dê
uma última olhada neste Sagrado Coração antes que ele exploda
(...)"
Ah, estava quase me esquecendo. Tenho uma terceira opinião sobre pós-modernidade:
Créditos: Quero dar o devido crédito ao autor de todos exemplos, com
exceção de um ou dois de minha autoria. Além de ser ético, do ponto de vista da
Lei Natural, também traz credibilidade às afirmações, pois mostra que não são
opiniões individuais. Pois, os exemplos se encontram todos no livro Cristianismo Puro e Simples de C. S. Lewis.
Nossa Sandrine! Muito bom como sempre. Sempre me surpreendo com seus textos.
ResponderExcluirOi Luciano. Obrigado por curtir o blog. Grande abraço. Ah, desculpe ter demorado tanto para publicar seu comentário e por respondê-lo. Só agora percebi que eu não estava recebendo as notificações de novos comentários por email. Sorry...
Excluir