"Louco é o homem que perdeu tudo, menos a razão."
Uma fotografia é uma imagem bidimensional, que contém registradas as diferentes intensidades de luz de uma cena qualquer. Complementarmente, um holograma inclui também a interferência dos feixes de luz provenientes da cena capturada. Em outras palavras, os hologramas são imagens ainda bidimensionais, mas que contemplam toda a informação necessária para criar uma representação tridimensional do objeto registrado. É como ver um filme 3D, em uma tela plana de cinema, sem precisar usar os óculos auxiliares – destaque para o contraste entre plano e 3D. Enfim, eu estou tentando chamar atenção para o fato de que a imagem tridimensional holográfica é como um "reflexo", projetado no espaço, da figura bidimensional. O holograma é uma ilusão.
Supondo que haja uma equação de tudo – ou várias equações –, que descreva a evolução do Universo desde o momento inicial até agora, poderíamos dizer então que as "diretrizes lógicas", ora traduzidas matematicamente, existiriam antes do próprio Cosmos? Para que o Universo ocorra, é necessário que as "regras" que o viabilizam existam antes? Quem é o "reflexo" de quem, entre a "realidade" e os princípios físicos sobre os quais ela se sustenta? Quem é a figura e quem é o holograma?
Pense na música, por exemplo. Uma melodia poderia existir antes de ser ouvida, ou antes mesmo de ser pensada? Será que o meio onde ondas mecânicas se propagam e a efetiva ocorrência disso não são somente a materialização de um conceito pré-existente? De fato, as notas musicais também podem ser representadas matematicamente, mas, ainda assim, gera-se uma expectativa sensorial, entre as combinações de sons, que parece suplantar os números.
Um último exemplo, a moral e a
ética. Já refletimos sobre o motivo pelo qual os povos de milênios atrás, no Oriente
Médio e na América, sacrificavam pessoas? Talvez por crueldade? Sim, acredito
que sim. Entretanto, parece haver algo além. Veja, por que eu acreditaria que
um deus se convenceria do meu "amor", se não fosse demonstrando uma capacidade de
praticar algo que minha moral clama como monstruoso? Ou seja, a minha
intelectualidade pode ser imatura – arbitrária, de fato – a ponto de tentar
agradar um deus às custas de outra pessoa, mas não às minhas próprias custas.
Porém, ela é rebuscada o suficiente, mesmo em seu obscurantismo bestial, para
perceber que há um preço ético muito elevado no sacrifício de pessoas. Graças a
Deus, aqueles hábitos foram abandonados – aliás, como estaríamos organizados
hoje se Deus não tivesse oferecido o último sacrifício? De qualquer forma, o que
eu estou tentando dizer é, parece-me que a moral e a ética precedem as
religiões, precedem a organização social, precedem o intelecto, mesmo os seres
humanos e, talvez, até o "mundo tangível". Reitero, quem é o holograma? Quem é a
ilusão? Onde está a fonte?
Aos mais desconfiados e aos mais românticos, não estou tentando insinuar qualquer tipo de relação entre teologia e ciência. Minha inquietação origina-se exclusivamente na ciência, ou melhor, na matemática, mais precisamente, na estatística. Tudo me parece colossalmente improvável. De qualquer forma, como citei, a pergunta "quem surgiu primeiro, o ovo ou a galinha?" é profunda demais e, talvez, possa exigir significativas releituras, se levada a sério. Provavelmente, por isso ela tornou-se uma piada.
Voltando: No grego, a palavra "logos" originalmente significava razão, pensamento, a lógica por traz de uma ideia. Entretanto, os filósofos da mesma região, e época, também usaram a palavra para representar algo mais amplo. Por exemplo, segundo Heráclito, o "logos" seria aquilo que conecta o discurso racional a estrutura também racional do mundo. Ela seria uma lei universal, um ponto de origem comum a partir do qual todas as coisas se estabelecem, embora as pessoas tenham um entendimento próprio do que as rodeia. Já para Aristóteles, o "logos" distinguiria o ser humano dos demais seres, pois é ele quem permite que as pessoas diferenciem o bem do mal, gerando então uma sociedade consciente e ética. Os filósofos estoicos se apropriaram do termo "logos" como um princípio gerador do Universo, o mesmo conceito que, posteriormente, influenciaria os neoplatonistas. Já segundo a definição do apóstolo João: "No princípio era o Logos, e o Logos estava com Deus, e o Logos era Deus. Todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez."
Enfim, a realidade parece ser apenas o holograma projetado no espaço de uma verdade precedente, independente e causal. Talvez, não possamos nem mesmo chamar nosso Universo, o espaço e o tempo de realidade. Estes, de certo, seriam apenas os efeitos colaterais de algo anterior. Quem sabe, eles seriam o resultado material inevitável de uma vontade de potência externa ao espaço. Ou seriam ainda a somatização de uma pulsão desatada do tempo. O Logos seria a resposta para a pergunta, "por que existe algo em vez de não existir nada?".
Tendo a acreditar que nós somos apenas um olhar pelo furo de uma janela fechada.
Eu li uma frase, de autoria desconhecida, que dizia: "na escala do Universo, árvores são mais raras que diamantes". A Alice passou tanto tempo neste "País", por isso deixou de maravilhar-se com ele. De fato, ela nasceu aqui e nem percebeu onde está inserida. Tudo se tornou trivial demais e por isso fez escolhas e tomou decisões levianamente. Ela reduziu tanto a complexidade das coisas que não somente abandonou o fascínio por elas, como deixou de enxergar qualquer piada nelas. Ela poderia, pelo menos, rir de si mesma. No "País das Maravilhas", a Alice renunciou a tudo, menos à razão. Antes tivesse deixado de lado somente esta última. Pois que seja então bem-vinda ao "País das Trivialidades".